Entre aves na floresta
A ornitóloga Emilia Snethlage realizou pesquisas pioneiras na Amazônia no início do século XX
Neldson Marcolin
Edição Impressa 188 - Outubro 2011
© ARQUIVO PESSOAL DA FAMÍLIA SNETHLAGE |
Emilia e sua espingarda com dois guias durante pesquisa de campo. |
Emilia Snethlage era natural de Brandemburgo, perto de Berlim. Aos 21 anos passou a educar crianças em casas na Alemanha, Inglaterra e Irlanda. Mas, aos 31 anos, mudou de rumo e ingressou no curso de história natural da Universidade de Berlim. O dinheiro pode ter vindo de suas economias feitas durante 10 anos, ou de uma pequena herança que teria recebido na época, segundo Miriam. Emilia também estudou em Jena e Freiburg, onde se doutorou em 1904.
Na volta a Berlim, trabalhou como assistente de zoologia do ornitólogo Anton Reichenow, decano do Museu de História Natural. Foi por seu intermédio que ela soube da procura de Emílio Goeldi por alguém com formação em ciências naturais – especialidade ainda inexistente no Brasil – e com domínio da língua alemã. Emilia tinha 37 anos e a provável perspectiva de passar a carreira toda como pesquisadora assistente em museus da Alemanha. Já na Amazônia, ela estaria sempre em campo, faria diferença como cientista e poderia continuar ligada às instituições, periódicos e especialistas europeus por meio de correspondência e viagens ocasionais.
No Museu Goeldi, Emilia começou como assistente de Emílio Goeldi, que a orientou na pesquisa sobre aves. “Ela continuou o projeto iniciado por ele em 1900. Goeldi retornou à Suíça em 1907 e Emilia assumiu a chefia da seção de zoologia; em 1914 publicou oCatálogo de aves amazônicas”, diz Nelson Sanjad, pesquisador de história da ciência do Museu Goeldi. “Mas seu trabalho realmente original foram os primeiros estudos sobre a biogeografia de aves, em que mostrava a distribuição geográfica delas na Amazônia.”
Em 1909 ela percorreu por quatro meses a zona entre os rios Xingu e Tapajós na companhia de sete índios Kuruaya – quatro homens e três mulheres. A aventura exploratória – feita em meio a ataques de malária – derrubou uma hipótese antiga de que haveria uma comunicação hidrográfica entre os dois rios, resultou na coleta de espécimes botânicos e zoológicos, além de levantamentos etnográficos.
Depois de 1914, ela foi duas vezes diretora do museu em um período marcado pela Primeira Guerra Mundial e pela falta de dinheiro e de apoio para a instituição. Por ser alemã, sofreu hostilidades e foi afastada da direção nas duas ocasiões. Em 1922 se transferiu para o Museu Nacional, no Rio de Janeiro, e continuou a percorrer as matas brasileiras até 1929, quando morreu de um ataque cardíaco em Porto Velho. Tinha 61 anos. Nunca se casou nem teve filhos. “Emilia Snethlage viveu apenas para sua ciência e demonstrava ser ascética. Mas isso não quer dizer que fosse triste. Nos seus relatos percebe-se sua alegria quando escrevia sobre as aves e os índios”, conclui Miriam Junghans.
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