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Migrantes, o apelo de Francisco: "Coloquemos pontes nos portos". Entrevista do Papa na volta do Marrocos
Falando a respeito de migrantes, ele explica que viu um vídeo mostrando "muros com facas colocadas ali para cortar: meu coração viu tanta crueldade". E diz que "não entra" em sua cabeça e em seu coração "ver afogamentos no Mediterrâneo". "Vamos colocar pontes nos portos", pede.
Depois fala sobre os populismos: "O medo é o discurso costumeiro dos populismos, é o início das ditaduras". E da liberdade de consciência que alguns "católicos não admitem desde que passou o Concílio Vaticano II": "Temos esse problema", ele afirma. E, ainda, desfere um golpe pesado contra a Europa: "Se essa Europa tão generosa vende armas ao Iêmen para matar crianças, como pode a Europa ser coerente?". A uma pergunta sobre o Congresso da Família de Verona (Nota de IHU On-Line: evento promovido pela direita italiana liderada por Matteo Salvini - Lega Nord, Vice Primeiro-Ministro e Ministro do Interior da Itália), explica que ele não entende de "política italiana". E novamente: "Eu realmente não sei o que é. Li a carta do cardeal Pietro Parolin e concordo, é uma carta pastoral de boa educação".
Assim fala o Papa Francisco no voo de regresso de Rabat, capital do Marrocos, sua segunda viagem apostólica para um país de maioria muçulmana.
A reportagem é de Paolo Rodari, publicada por La Repubblica, 31-03-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis a entrevista.
Houve momentos muito fortes, esta visita foi um evento histórico excepcional, histórico para o povo marroquino. Quais são as consequências desta visita para o futuro, para a paz mundial, para a coexistência no diálogo entre culturas?Agora são flores, os frutos virão depois. Mas as flores são promissoras. Fico feliz porque nessas duas viagens pude falar sobre o que tanto toca o meu coração: a paz, a unidade, a fraternidade. Com os irmãos muçulmanos e muçulmanas selamos essa fraternidade no documento de Abu Dhabi e aqui no Marrocos todos nós vimos uma liberdade, uma fraternidade, uma acolhida de todos os irmãos com muito respeito. Essa é uma linda flor de coexistência que promete dar frutos. Nós não devemos desistir! É verdade que ainda haverá dificuldades, muitas dificuldades porque, infelizmente, existem grupos intransigentes.
“Os construtores de muros, sejam com
lâminas cortantes como facas ou com tijolos, se tornarão prisioneiros
dos muros que fazem. A história dirá” – Papa Francisco
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Vocês assinaram um pacto por Jerusalém, o que pensa disso?
“Construir pontes para mim é algo que vai além do humano, é preciso um grande esforço” – Papa Francisco
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Ontem, o rei do Marrocos disse que vai proteger judeus marroquinos e cristãos de outros países que vivem no Marrocos. O que o senhor pensa dos muçulmanos que se convertem ao cristianismo? Está preocupado com esses homens e mulheres que correm risco de serem presos?
Eu posso dizer que no Marrocos há liberdade de culto, há liberdade religiosa, há liberdade de pertencimento religioso. A liberdade sempre se desenvolve, cresce: basta pensar em nós, cristãos, 300 anos atrás: havia essa liberdade que temos hoje? A fé cresce na consciência, na capacidade de entender a si mesma. Um monge francês, Vincenzo De Lerine, cunhou uma bela expressão para explicar como se pode crescer na fé: crescer na moral, mas sempre permanecendo fiel às raízes. Ele disse três palavras que realmente marcam o caminho: crescer na explicitação e na consciência da fé e da moral deve ser algo consolidado ao longo dos anos e ampliado ao longo do tempo, mas é a mesma fé sublimada nos anos. Assim, compreende-se, por exemplo, o fato de que hoje removemos a pena de morte do Catecismo da Igreja Católica: 300 anos atrás os heréticos eram queimados vivos, a Igreja cresceu em consciência moral. O respeito pela pessoa e a liberdade de culto também estão crescendo e nós também devemos continuar a crescer. Há católicos que não aceitam o que o Vaticano II disse sobre liberdade de culto, a liberdade de consciência. Temos esse problema, mas nossos irmãos muçulmanos também crescem em consciência e alguns países não entendem bem ou não crescem tão bem quanto outros.
“Somos todos cidadãos de Jerusalém, todos os crentes” – Papa Francisco
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O cardeal Barbarin - acusado de acobertar os abusos de um sacerdote de sua diocese (ndr) - nasceu em Rabat. Esta semana o conselho da diocese de Lyon votou quase por unanimidade para que seja encontrada uma solução duradoura para seu afastamento. É possível que o senhor ouça esse apelo?
“Há católicos que não aceitam o que o
Vaticano II disse sobre liberdade de culto, a liberdade de consciência.
Temos esse problema” – Papa Francisco
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No discurso de sábado para as autoridades, disse que o fenômeno da migração não se resolve com barreiras físicas, mas aqui no Marrocos, a Espanha construiu duas barreiras com lâminas para ferir aqueles que querem ultrapassá-las. Trump disse, nos últimos dias, que quer fechar completamente as fronteiras e suspender a ajuda a três países da América Central. O que o senhor gostaria de dizer a esses governantes, a esses políticos que ainda defendem essas decisões?
Primeiro de tudo o que eu disse há pouco: os construtores de muros, sejam com lâminas cortantes como facas ou com tijolos, se tornarão prisioneiros dos muros que fazem. A história dirá. Segundo: quando Jordi Évole me entrevistou, ele me mostrou um pedaço daquele arame farpado com lâminas. Eu lhe digo sinceramente que fiquei abalado e quando ele saiu eu chorei. Chorei porque não entra na minha cabeça e no meu coração tamanha crueldade. Não entra na minha cabeça e no meu coração ver afogamentos no Mediterrâneo: vamos colocar pontes nos portos. Este não é o modo para resolver o grave problema da imigração.
Foto: InfoLibre
Foto: La Sexta
“Aqueles que constroem pontes, irão sempre em frente” – Papa Francisco
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O senhor luta há muitos anos para proteger e ajudar os migrantes, como fez nos últimos dias no Marrocos. A política europeia vai exatamente na direção oposta. A Europa se torna um bastião contra os migrantes. Essa política reflete a opinião dos eleitores. A maioria desses eleitores são cristãos católicos. Como se sente diante dessa triste situação?
“O que me preocupa é outra coisa: o retrocesso de nós, cristãos, quando removemos a liberdade de consciência” – Papa Francisco
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É verdade, para ser compreensivos, que o primeiro trabalho que temos a fazer é tentar fazer com que as pessoas que migram por causa da guerra ou da fome não tenham essa necessidade. Se essa Europa tão generosa vende as armas ao Iêmen para matar crianças, como a Europa pode ser coerente? E digo, este é um exemplo, mas a Europa vende armas.
"Os direitos humanos vêm antes de acordos". Esta frase merece o Prêmio Nobel” – Alexis Tsipras citado por Papa Francisco
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Em segundo lugar, sobre como agir: é verdade que um país não pode receber a todos, mas há toda uma Europa para distribuir aos migrantes, há toda a Europa. Porque o acolhimento deve ser de coração aberto, depois acompanhar, promover e integrar. Se um país não pode integrar, deve pensar imediatamente em conversar com outros países: quanto você pode se integrar, para dar uma vida digna às pessoas.
“Semeia-se o medo e depois se tomam as decisões. O medo é o início das ditaduras” – Papa Francisco
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O senhor muitas vezes denuncia a ação do diabo, também o fez na recente cúpula. Ultimamente ele tem trabalhado duro. O que fazer para combatê-lo, especialmente no que diz respeito aos escândalos da pedofilia?
Um jornal, após meu discurso no final da cúpula dos presidentes das conferências episcopais, escreveu: o Papa foi esperto, primeiro disse que a pedofilia é um problema mundial, depois disse algo sobre a Igreja, no final ele lavou suas mãos e culpou o diabo. Um pouco ‘simplista’ não?
“Aprendemos com a história, isso não é
novo: semear medo é fazer uma colheita de crueldade, de fechamentos e
até de esterilidade” – Papa Francisco
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“A Europa, se quiser ser a mãe Europa e
não a avó Europa precisa investir, precisa tentar de forma inteligente
ajudar a elevar com a educação, com os investimentos e isso não é uma
opinião minha, foi dita pela chanceler Merkel”
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Um governo não pode identificar onde esses vídeos com crianças são feitos? Todas filmados ao vivo. Isso para dizer que o flagelo mundial é grande, mas também que não se pode compreender sem o espírito do mal: é um problema concreto.
Para resolver isso, há duas publicações que recomendo: um artigo de Gianni Valente no Vatican Insider, onde ele fala sobre os donatistas. O perigo da Igreja hoje de se tornar donatista, fazendo prescrições humanas, esquecendo as outras dimensões. A oração, a penitência, que não estamos acostumados a fazer. Ambas! Porque, para vencer o espírito do mal não serve “lavar-se as mãos”, dizer “o diabo faz isso”, não. Nós também devemos lutar contra o diabo, contra as coisas humanas.
“Com medo não iremos à frente, com os muros ficaremos fechados nesses muros” – Papa Francisco
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Eu gostaria de lhes dizer: A Igreja não é congregacionalista, é católica, onde o bispo deve tomar as decisões em mãos e também o Papa deve fazer isso, como pastor. Mas como? Com as medidas disciplinares e também com a penitência, com a oração. Eu ficaria grato se vocês estudassem as duas coisas: a parte humana e espiritual.
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