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Friday, 26 September 2014

Brasil na Cúpula do Clima: retrocesso e oportunidade perdida

eco
http://www.oeco.org.br/noticias/28675-brasil-na-cupula-do-clima-retrocesso-e-oportunidade-perdida

Brasil na Cúpula do Clima: retrocesso e oportunidade perdida
Daniele Bragança - 26/09/14

Retrocesso, incoerência, perda de oportunidade, falta de liderança. Essas foram opiniões dadas por ambientalistas que acompanham negociações climáticas ouvidos pelo ((o))eco para descrever a postura do Brasil em não assinar o acordo da Cúpula do Clima da Organização das Nações Unidas (ONU), que previa a meta de reduzir o desmatamento pela metade até 2020 e a zero até 2030.
A Cúpula do Clima terminou com compromisso assumido por 150 países. O Brasil não assinou.
Conversamos com Sérgio Abranches, cientista político e autor do livro Copenhague, antes e depois, sobre a Conferência das Partes do Clima em Copenhague (COP 15), realizada em 2009. Abranches ressaltou que as emissões brasileiras têm aumentado e que as grandes obras do governo estão estimulando o desmatamento. Para Mario Mantovani, diretor de políticas públicas da Fundação SOS Mata Atlântica, estamos assistindo a um dos retrocessos mais absurdos da história da política ambiental brasileira, em que o Brasil volta a abraçar um discurso "anos 70" de que é direito dos países em desenvolvimento poluir até se igualarem ao ricos. Carlos Rittl,  secretário executivo do Observatório do Clima, enfatizou que o governo brasileiro já havia se comprometido com a sociedade brasileira a zerar o desmatamento líquido em todos os biomas do país. A meta era para que essa realidade começasse a valer já em 2015.
Veja a posição de cada especialista
Sérgio Abranches: “o governo Dilma não tem nenhum compromisso ambiental, nem climático”
Sergio Abranches
O Brasil já havia superado essas discussões,  já tinha feito o debate da questão florestal no debate climático. E agora, quando ele se recusa a participar do compromisso de diminuir pela metade o desmatamento até 2020 e a zero até 2030, recusa-se a ter uma liderança no processo na política florestal global.
E essa recusa é ruim, pois o Brasil deveria ter essa liderança por duas razões, uma positiva e uma negativa. A razão positiva é que nós somos uma potência florestal. Temos a maior reserva florestal do mundo. A segunda, porque nós continuamos sendo o maior desmatador do mundo. Então, em ambos os aspectos, nós temos um capital florestal significativo, e existe um dever de casa importante pra fazer na questão do desmatamento. A gente tinha que participar, era nossa obrigação.
Então, foi mal casada a atitude que o Brasil teve lá em Nova York. O discurso da Dilma foi um discurso muito fraco. Ela fez algo que tem repetido com certa frequência, que esconde as fragilidades do governo dela, principalmente na área ambiental: falar do passado sem admitir os problemas do presente.
Caíram as emissões florestais, mas o fato é que as emissões do setor de transporte, energia e agricultura estão aumentando muito. E o governo não faz absolutamente nada para diminuir as emissões, pelo contrário, ele incentiva, seja sujando a matriz elétrica, seja subsidiando a gasolina e o óleo diesel. O governo tem um papel ativo no aumento das emissões. E na questão das florestas, ele também tem um papel ativo. Porque as obras de infraestrutura do governo são os maiores vetores de desmatamento. O governo não exige o cumprimento de nenhuma das condicionantes ambientais dos licenciamento das obras de infraestrutura, faz vista grossa para a área ambiental e social e continua tocando obras. E isso, evidentemente, estimula o desmatamento. É um reflexo, uma demonstração, de que o governo Dilma não tem nenhum compromisso ambiental, nem climático.  
Mario Mantovani: “Foi um tiro no pé. Contra o Brasil, contra o meio ambiente e contra a humanidade”
Mario-Mantovani Credito Carol-Coelho 01-min
O Brasil ficou na cadeira de um processo em que estava indo muito bem, graças a Deus, e que não dependia desse governo. E agora a gente está assistindo um dos retrocessos mais absurdos da história.
Além [do governo] ter destruído o Ministério do Meio Ambiente e a gestão das Unidades de Conservação, ter deixado prosperar a PEC 215, não regularizar a PEC do Cerrado, entre tantas oportunidades que o Brasil está perdendo, essa agora foi um tiro no pé. Contra o Brasil, contra o meio ambiente e contra a humanidade.
A gente tinha mudado essa postura. Em vários fóruns, o Brasil tinha tomado a liderança. O que acabou de acontecer foi um golpe contra todo esse processo. O Brasil estava saindo desse discurso dos anos 70 [de defender que os países pobres mantenham a prerrogativa de se desenvolver, mesmo à custa do meio ambiente, como fizeram os países ricos no passado. Esse papo não cola mais. A Dilma está ressuscitando esse papo.
Sobre a Izabella, para quem fez a escadinha de APP, não tem moral para falar que o Brasil não sabia. Sabia muito bem, sim senhor, porque foi consultada. Ela usou essa mesma conversa pra aliviar na Rio+20. Aquele documento pífio, esdrúxulo, que apresentou lá e onde usou essa mesma justificativa: o Brasil precisa amadurecer e tal, isso é coisa de quem não tem o que falar e é melhor ficar quieto do que falar besteira.
Carlos Rittl: “Nós mesmos tínhamos uma meta melhor"
Rittl
Foi uma grande oportunidade perdida. Precisamos lembrar que o Brasil, em 2008, incluiu no seu Plano Nacional de Mudanças Climáticas o objetivo de reduzir a zero o desmatamento líquido em todos os biomas até 2015. Esse compromisso proposto por essa coalizão de países e instituições, ele é pra 2030. Nós mesmos já assumimos esse compromisso internamente.
Se o Brasil estava falando sério sobre esse compromisso assumido pelo governo perante a sociedade brasileira, isso já teria sido suficiente para deixar o país em plenas condições de assinar um compromisso similar assumido pelos outros países, porque a nossa meta seria de antecipar o que se pretende chegar em 2030. É de lamentar, então, o discurso da ministra Izabella e o fato do Brasil ter ficado de fora desse acordo.
O Brasil é um grande emissor, talvez o 7º maior emissor mundial. Está entre os 5 responsáveis pelo aquecimento global acumulado, de acordo com estudos recentes.
A impressão é que o governo está confortável em relação ao que já fez e não tem grandes obrigações daqui pra frente. Não dá mais para ficar olhando pelo retrovisor apenas. Precisamos entender que, em algum momento, o Brasil será cobrado a assumir compromissos obrigatórios de redução de suas emissões nas negociações sobre clima da Conferência de Mudanças Climáticas das Nações Unidas. 
O país repete esse discurso [de não se comprometer] como se fosse contraditório reduzir as emissões e reduzir os riscos dos impactos das mudanças climáticas. Como se fosse contraditório você investir em medidas de mitigação e adaptação. Como se não fosse muito mais caro não fazer, não assumir compromissos,  não preparar nossa economia para esse momento em que todos serão cobrados pelas emissões que provocam.  

Monday, 25 August 2014

O Protocolo de Nagoya e a divisão equitativa dos recursos genéticos mundiais

ihu
http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/o-protocolo-de-nagoya-e-a-divisao-equitativa-dos-recursos-geneticos-mundiais-entrevista-especial-com-braulio-dias/534587-o-protocolo-de-nagoya-e-a-divisao-equitativa-dos-recursos-geneticos-mundiais-entrevista-especial-com-braulio-dias

O Protocolo de Nagoya e a divisão equitativa dos recursos genéticos mundiais. Entrevista especial com Bráulio Dias

“A ratificação do Protocolo de Nagoya é um processo que continua em aberto e que qualquer país, a qualquer momento, pode vir a ratificar, caso tenha assinado o compromisso de adesão”, esclarece o secretário executivo do Secretariado da Convenção da Diversidade Biológica.
Foto: grupogarra
Protocolo de Nagoya, que entrará em vigor internacionalmente em outubro deste ano, estabelece as regras para a repartição de benefícios do uso de recursos genéticos de forma justa e equitativa entre os países membros. Resultado daConvenção da Diversidade Biológica – CDB, que tem 193 países membros, mais a União Europeia, o Protocolo já foi ratificado por 50 países, e a expectativa do secretariado da CDBé de que até a data da primeira conferência das partes doProtocolo, que ocorrerá em outubro deste ano na Coreia, “vários outros países já tenham protocolado o seu documento de ratificação”, diz Bráulio Dias à IHU On-Line.
Na entrevista a seguir, concedida por telefone de seu escritório em Montreal, no CanadáDias explica que o Protocolo surge como demanda dos países em desenvolvimento, para os quais é “necessário ter uma definição maior de regras internacionais para proteger os seus interesses nacionais”. Nesse sentido, esclarece, “o Protocolo de Nagoya prevê que os países usuários de recursos genéticos de outros países têm de designar agências que funcionem como agências verificadoras. Isso para ver se de fato o recurso genético e o conhecimento tradicional que está entrando no seu país e está em uso na pesquisa de desenvolvimento tecnológico e, eventualmente, em uso comercial tem procedência legal, se foi obtido com essas permissões legalmente previstas no país de origem ou se é um objeto de biopirataria”.
Brasil, apesar de ser membro da Convenção da Diversidade Biológica e já ter um Marco Legal Nacional, ainda não ratificou sua participação no Protocolo, mas há expectativa em relação à assinatura, “porque é o país mais rico em biodiversidade no mundo e, portanto, tem o potencial de ser o maior provedor de recursos genéticos para outros países e se beneficiar economicamente do uso desses recursos e dos conhecimentos tradicionais associados”, assinala o secretário executivo do Secretariado da CDB. Ele lembra que o país tem um setor econômico “desenvolvido e baseado na biodiversidade”, portanto, interessa ao país, “enquanto usuário de recursos genéticos, poder manter o acesso a esses recursos, sejam eles de origem brasileira ou do exterior. Nesse sentido, é importante que o Brasil possa também participar ativamente do Protocolo para se beneficiar das suas regras”.
As regras do Protocolo de Nagoya também visam evitar a biopirataria ao “reconhecer a soberania dos países sobre seus recursos genéticos. Então, nenhum acesso a recurso genético pode ser feito sem uma decisão e autorização do país de origem daquele recurso. O Protocolo de Nagoya estabelece a necessidade de cada país designar uma autoridade nacional, ou seja, designar uma agência que funciona como a agência nacional para dar as autorizações de acesso aos recursos genéticos”, pontua.
Bráulio Dias é graduado em Ciências Biológicas pela Universidade de Brasília – UnB e doutor em Zoologia pelaUniversidade de EdimburgoEscócia. Foi vice-presidente da União Internacional de Ciências Biológicas e Coordenador do Comitê Gestor de Informação sobre a Biodiversidade Rede Interamericana. Desde 2012 é Secretário Executivo das Nações Unidas do Secretariado da Convenção da Diversidade Biológica.
Confira a entrevista.
Foto: ONU
IHU On-Line - Pode contextualizar como e por que foi sugerida a criação do Protocolo de Nagoya?
Bráulio Dias – O Protocolo de Nagoya foi solicitado em 2002 durante a Cúpula de Desenvolvimento Sustentável em Joanesburgo, na África do Sul. Contudo, na Eco-92, naCúpula de Meio Ambiente e Desenvolvimento, no Rio de Janeiro, foi adotada a convenção propriamente — a qual havia sido negociada durante cerca de três anos —, e os países iniciaram o processo de adesão à convenção. O texto da convenção já incluía o compromisso de repartição do benefício por parte dos países membros. Nesse sentido, a convenção tem três grandes objetivos: promover a conservação da biodiversidade, promover o uso sustentável dos componentes da biodiversidade e promover a repartição justa e equitativa de benefícios resultantes do uso de recursos genéticos. Então, oProtocolo de Nagoya está relacionado à implementação desse terceiro objetivo da convenção. Desse modo, esse já era um componente integral da convenção desde 1992, quando ela foi aberta à assinatura. A convenção entrou em vigor, internacionalmente, em dezembro de 1993, quando alcançou o número mínimo de ratificação dos países.
IHU On-Line - Quais foram os países que inicialmente assumiram uma postura favorável de assinar a convenção, especialmente no que se refere à implementação do terceiro objetivo?
Bráulio Dias – O princípio da repartição dos benefícios foi negociado e acordado no texto da convenção, portanto, ele foi apoiado por todos os países que assinaram o compromisso de ratificar, incluindo os Estados Unidos, que assinaram o compromisso considerando o objetivo de promover a repartição do benefício. A dificuldade, entretanto, foi na implementação desse princípio, quer dizer, como promover a repartição dos benefícios. Para decidir isso, foi necessário um processo longo de discussão na convenção, o qual resultou, inicialmente, em um guia voluntário para orientar os países de como implementar esse princípio de repartição de benefícios, que foi aprovado no início dos anos 2000. Só que em 2002, naCúpula de Desenvolvimento Sustentável em Joanesburgo, na África do Sul, todos os chefes de Estado aprovaram um requerimento à Convenção da Diversidade Biológica - CDB para que se iniciasse um processo de negociação de um regime internacional sobre as regras para implementar esse princípio de repartição de benefícios. Essa foi uma solicitação unânime de todos os países, a qual consta como um dos resultados da cúpula de Joanesburgo.

“O princípio da repartição dos benefícios foi negociado e acordado no texto da convenção, portanto, ele foi apoiado por todos os países que assinaram o compromisso de ratificar, incluindo os Estados Unidos”

A partir daí, então, o secretariado da CDB promoveu reuniões a partir de decisões da conferência das partes da convenção, que criou um grupo de trabalho especializado só para negociar oProtocolo de Nagoya. Esse grupo se reuniu cerca de oito anos, que foi o tempo necessário de longas negociações, porque essa temática envolve uma série de aspectos técnicos e jurídicos inovadores e, portanto, foi necessária muita negociação para se chegar a um acordo. Essas reuniões resultaram, portanto, no Protocolo que foi adotado em Nagoya, no Japão, em 2010.
Uma vez adotado o Protocolo, abriu-se o período para que os países assinassem o compromisso de ratificação. Assim, 92 países, incluindo o Brasil, assinaram esse compromisso; quer dizer, o Brasil, via Itamaraty, através da embaixadora do país emNova York, assinou formalmente um ofício de compromisso de ratificação, juntamente com outros 91 países. A partir de então, cada país começou o seu processo interno de discussão para promover a ratificação do Protocolo de Nagoya. Para entrar em vigor, necessitava-se que pelo menos 50 países ratificassem o documento formalmente mediante decisão do seu Congresso Nacional ou do seu gabinete de ministros, ou do seu presidente, enfim, conforme as leis nacionais de cada país. Nós conseguimos, no início de julho, alcançar esse número e, portanto, o Protocolo entra em vigor, formalmente, a partir do dia 12 de outubro deste ano.
Agora, o fato de outros países ainda não terem ratificado o Protocolo não impede que eles venham a fazer isso. Então, a ratificação é um processo que continua em aberto e que qualquer país, a qualquer momento, pode vir a ratificar, caso tenha assinado o compromisso de adesão. Se não assinaram, podem aderir ao protocolo — aí o termo não é mais ratificação, mas é adesão ou acesso ao protocolo. Então, esse é um processo que continua e vai continuar nos próximos anos para outros países aderirem ao protocolo.
IHU On-Line - Como se deu o processo de elaboração e negociação entre os países sobre o terceiro princípio doProtocolo de Nagoya, referente ao acesso a recursos genéticos e à repartição justa e equitativa dos benefícios advindos de sua utilização?
Bráulio Dias – Para explicar esse processo, devemos voltar às origens da convenção. Esse objetivo de repartição dos benefícios foi um objetivo reivindicado pelos países em desenvolvimento. Inicialmente os países desenvolvidos queriam apenas promover a conservação da biodiversidade e, no avançar das negociações, concordou-se também que deveria se tratar de regras de uso sustentável da biodiversidade. No final, concordou-se, por demanda dos países em desenvolvimento, em incluir também o objetivo de repartição dos benefícios, porque os países em desenvolvimento são os principais provedores de biodiversidade, são os que mais detêm a biodiversidade do mundo e, no passado – especialmente durante o período colonial –, eles foram explorados de uma forma não justa e equitativa. Ou seja, os países ricos ficaram ricos por utilizar os recursos biológicos e genéticos de países que foram colonizados, e os países colonizados não receberam benefícios por conta do uso de seus recursos. Então, a grande reivindicação na negociação da CDB era de dar mais equidade entre as relações dos países para que os países ricos em biodiversidade pudessem se beneficiar realmente dessa riqueza. Essa foi a grande razão da origem do Protocolo de Nagoya.

“A grande reivindicação na negociação da CDB era de dar mais equidade entre as relações dos países para que os países ricos em biodiversidade pudessem se beneficiar realmente dessa riqueza”

Ratificação
Como o protocolo trata de interesses de vários setores, não apenas da área ambiental, mas de interesses do setor de ciência e tecnologia, de agricultura, de saúde, de energia, todos esses setores devem ser consultados. Nesse sentido, a ratificação do protocolo pressupõe todo um processo de consulta nacional aos diferentes setores, como a consulta aos detentores dos recursos genéticos e dos conhecimentos tradicionais - aí nós estamos falando principalmente de povos indígenas e comunidades locais como quilombolas, caiçaras e outros tantos -, os quais, se chegarem a um acordo, possibilitam a ratificação. Então, cada país tem as suas regras e a sua complexidade do ponto de vista dos interesses setoriais. Por isso, essas consultas são mais ou menos demoradas nos distintos países, e esse é um processo natural. Para você ter uma ideia, por exemplo, na Colômbia, por exigência constitucional, qualquer nova legislação ou ratificação de acordo internacional que trata de interesses indígenas requer, antes, uma consulta prévia a cada povo indígena separadamente. Por isso, o processo de consulta é demorado. Vários países federados tiveram que fazer consulta também junto aos estados, ou províncias, e outros países realizaram estudos técnicos sobre possíveis impactos econômicos da ratificação do Protocolo sobre as suas economias. Nós estamos monitorando esse processo, provendo capacitação, ajuda técnica e informação para os distintos países no sentido de ajudá-los nesse processo nacional de consultas. O Brasil, por exemplo, tem feito uma série de consultas junto com outros países e nós aguardamos também que o país possa vir a ratificar o acordo.
IHU On-Line - O Brasil é detentor de cerca de 15 a 20% da biodiversidade do planeta, foi um dos principais negociadores do Protocolo de Nagoya e um dos primeiros países a assiná-lo. Por quais razões o Brasil ainda não ratificou o acordo? Quais foram os argumentos do Estado brasileiro?
Bráulio Dias – Não houve nenhuma decisão de não ratificação; esse é um processo ainda em aberto e em consulta noBrasil. Não há um prazo para ratificação, a qualquer momento os países podem aderir ao protocolo. O que havia era uma obrigação de alcançar o número de pelo menos 50 ratificações para que o Protocolo entrasse em vigor legalmente a nível mundial. A convenção tem 193 países membros, mais a União Europeia, e esperamos que eventualmente todos esses países possam vir a fazer parte do Protocolo como membros. Além desses 50 países que já ratificaram, nós temos informações de que vários outros países estão em fase final dos processos de consulta e de aprovação no Executivo e noLegislativo, e esperamos que até outubro, quando vamos realizar a primeira conferência das partes do protocolo naCoreia, vários outros países já tenham protocolado o seu documento de ratificação. Mesmo depois dessa primeira conferência, ainda assim, a qualquer momento outros países poderão aderir ao Protocolo.
É preciso chamar a atenção de que se o país não aderir inicialmente ao Protocolo, ele perde a capacidade de influir nas negociações das conferências do Protocolo, as quais vão tratar de detalhá-lo, resolver questões ainda com a necessidade de maior discussão, criar certos mecanismos e procedimentos. Caso o Brasil não ratifique, perde a possibilidade de influenciar nessas decisões.
Também é importante chamar a atenção de que o Brasil já está comprometido com a obrigação de repartir benefícios, pelo fato de ter ratificado a adesão à convenção por uma decisão do Congresso Nacional em fevereiro de 1994. Então, a CDB já vale para o Brasil, incluindo o compromisso de respeitar o princípio de repartição de benefícios. Tanto é que o Brasil já dispõe de um Marco Legal Nacional, que foi criado no ano 2000, através de uma medida provisória, o qual determina as regras internas para promover acesso e repartição de benefícios. Portanto, esse é um compromisso que o Brasil já tem; não é o Protocolo de Nagoya que está criando esse compromisso. O protocolo apenas definiu regras iguais a nível mundial para detalhar como implementar esses compromissos de repartição de benefícios.
IHU On-Line - Diante disso esperava-se que o Brasil já tivesse ratificado o Protocolo ou esse processo de aguardar é normal?
Bráulio Dias - É normal. Evidente que temos grandes expectativas em relação ao Brasil, porque ele é o país mais rico em biodiversidade no mundo e, portanto, tem o potencial de ser o maior provedor de recursos genéticos para outros países e se beneficiar economicamente do uso desses recursos e dos conhecimentos tradicionais associados. Por outro lado, o Brasiltem um setor econômico bastante desenvolvido e baseado na biodiversidade: todo setor agrícola e agropecuário brasileiro é dependente dos recursos genéticos, todo o setor de saúde, de pesquisas, desenvolvimento de vacinas, remédios e drogas é dependente de recursos genéticos, bem como os setores da biotecnologia e de biocombustíveis. Portanto, interessa também ao Brasil, enquanto usuário de recursos genéticos, poder manter o acesso a esses recursos genéticos, sejam eles de origem brasileira ou do exterior. Nesse sentido, é importante que o Brasil possa também participar ativamente doProtocolo para se beneficiar das suas regras.
Então, se o Brasil, digamos, em um futuro próximo, tiver ocorrência de uma nova doença ou praga em plantações de café, de cana-de-açúcar, soja, laranja, eucalipto e outras grandes culturas, ou então na criação de animais, como o gado zebu e tantos outros que têm origem externa, e necessitar obter novos acessos de recursos genéticos de outros países, mesmo que o Brasil não tenha aderido ao Protocolo de Nagoya, ao solicitar a permissão de acesso para a coleta de novos recursos genéticos em outros países, esses outros países vão exigir que o Brasil respeite as regras do Protocolo de Nagoya.
IHU On-Line – Apesar de o senhor apontar como normal o processo de vários países não terem ratificado o acordo, como avalia os números, considerando que dos mais de 190 países membros da convenção, por enquanto só 50 ratificaram o documento? O que esse indicativo significa? A expectativa era de que mais países tivessem ratificado imediatamente ou não?
Bráulio Dias - A ratificação de acordos internacionais normalmente demora vários anos, é natural. Então, já esperávamos que fosse ter certa demora. Conseguir essas 50 ratificações agora foi muito bom, e a informação que temos é que praticamente todos os países membros da convenção estão com processos ativos de consulta, de discussões, de negociações internas, discussões nos seus Congressos Nacionais, nos seus ministérios, com comunidades indígenas e locais para finalizar uma decisão sobre a adesão ao protocolo. Então, nós esperamos que, com o passar do tempo, esse número continue a crescer e que eventualmente possa alcançar o mesmo número de ratificações da própria convenção.

“Existe um consenso geral no Brasil de que o Marco Legal existente no país é muito burocrático, na medida em que se criou um excesso de exigências, o que acaba funcionando como um desestímulo à pesquisa e ao desenvolvimento de tecnologia”

Para mencionar um exemplo, o protocolo de Cartagena, sobre biossegurança, comemorou dez anos no ano passado e ainda não atingiu o número total de ratificações possíveis. Ele tem, se não me engano, 167 ratificações e somente pouco mais de 20 países membros da convenção ainda não aderiram ao protocolo de Cartagena, mas ainda poderão fazê-lo.
IHU On-Line - Quais são as regras do Protocolo de Nagoya sobre o acesso a recursos genéticos e a repartição justa e equitativa dos benefícios advindos de sua utilização?
Bráulio Dias – A primeira regra estabelecida pela convenção é de reconhecer a soberania dos países sobre seus recursos genéticos. Então, nenhum acesso a recurso genético pode ser feito sem uma decisão e autorização do país de origem daquele recurso. O Protocolo de Nagoya estabelece a necessidade de cada país designar uma autoridade nacional, ou seja, designar uma agência que funciona como a agência nacional para dar as autorizações de acesso aos recursos genéticos. O Brasil já tem um órgão responsável, o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético - Cgen, que foi estabelecido em 2002. O Protocolo também define a necessidade de cada país estabelecer um Marco Legal Nacional para detalhar as regras de implementação do Protocolo de Nagoya, porque vários detalhes o Protocolo remete para a legislação nacional. O Brasil já tem um Marco Legal Nacional desde o ano 2000, que foi revisado em 2001 e está vigente até hoje. Porém, há todo um processo de discussão para a revisão do Marco Legal, porque existe um consenso geral no Brasil de que ele é muito burocrático, na medida em que se criou um excesso de exigências, o que acaba funcionando como um desestímulo à pesquisa e ao desenvolvimento de tecnologia. Portanto, como consequência, há um desestímulo ao uso econômico da biodiversidade e, sem o uso, não vai haver repartição de benefícios. Então, há um consenso no país de que é necessária uma revisão do Marco Legal para manter um equilíbrio melhor entre controle e incentivo para regulamentar esse setor.
Já existem outros projetos de lei em relação a isso e, recentemente, a presidente encaminhou ao Congresso Nacional uma última versão de projeto de lei, e nós aguardamos, aqui em Montreal, notícias sobre os avanços nessas negociações. Uma das razões da “demora” do Brasil em ratificar o Protocolo, é que vários setores manifestaram interesse de que o país só ratifique o Protocolo de Nagoya depois de aprovar a revisão do Marco Legal Nacional. Então, isso cria um processo mais extenso que necessita primeiro superar essa etapa para depois poder realizar a ratificação.
IHU On-Line - Qual deve ser o impacto do Protocolo de Nagoya sobre a biopirataria?
Bráulio Dias – Essa é a expectativa, ou seja, que o Protocolo tenha um impacto sobre a biopirataria, porque um Marco Legal Nacional, uma Legislação Nacional só tem alcance dentro dos limites da fronteira do país. Se uma amostra de recursos genéticos sai do país, uma vez que isso ocorre a legislação nacional não tem mais alcance. Então, por isso que países em desenvolvimento entenderam que era necessário ter uma definição maior de regras internacionais para proteger os seus interesses nacionais. Nesse sentido, o Protocolo de Nagoya, por exemplo, prevê que os países usuários de recursos genéticos de outros países têm de designar agências que funcionem como agências verificadoras. Isso para ver se de fato o recurso genético e o conhecimento tradicional que está entrando no seu país e está em uso na pesquisa de desenvolvimento tecnológico e, eventualmente, em uso comercial tem procedência legal, se foi obtido com essas permissões legalmente previstas no país de origem ou se é um objeto de biopirataria. O protocolo estabelece obrigação dos países usuários de colaborar onde houver uma denúncia de biopirataria para a solução desses casos, inclusive com acesso à Justiça.
IHU On-Line – Quais são as principais estratégias nacionais que já estão sendo desenvolvidas para a conservação da biodiversidade biológica pelos países que já aderiram à convenção? O senhor tem exemplos do que tem sido feito pelo mundo?
Bráulio Dias – Tem uma diversidade bastante grande de ações, e a principal fonte de informação mais recente é a que consta no quinto relatório nacional que os países estão enviando ao secretariado da CDB. Nós já recebemos relatórios de pouco mais de 90 países e tem mais uns 30 países que já nos enviaram uma versão quase final, que é o caso do Brasil.
O país ainda não publicou o seu quinto relatório nacional, mas já nos enviou uma versão quase final. Estão só aguardando uma aprovação final das autoridades, e a expectativa é que até setembro esse relatório estará publicado; ele tem informações bastante atualizadas sobre as ações realizadas no Brasil.
Global Biodiversity Outlook - GBO-4
No site da convenção, nós temos informações sobre os informes nacionais, então é possível fazer consultas sobre a situação de implementação da convenção em cada país. Além disso, em outubro deste ano, na próxima conferência, nós vamos lançar o quarto relatório global do panorama global da biodiversidade - Global Biodiversity Outlook - GBO-4. Esse relatório já está em fase final de editoração e vai ser publicado em inglês, espanhol e francês pelo secretariado da convenção e lançado durante a conferência na Coreia.
Nós estamos em contato com o Ministério do Meio Ambiente do Brasil, que manifestou interesse de providenciar a tradução para o português desse relatório com vista ao seu lançamento, se possível, também simultaneamente durante a realização da COP-12 na Coreia. Esse relatório é uma fonte de informação bastante rica e analisa avanços das 20 metas globais de biodiversidade. Nesse sentido, ele analisa, meta por meta, onde estamos avançando mais, onde estamos avançando menos e onde não há muito avanço; é um relatório que detalha bastante bem essa situação. O principal item na agenda da pauta dessa conferência na Coreia é fazer um balanço dos avanços da implementação desses compromissos, incluindo o Protocolo de Nagoya, e chegar a um acordo sobre o que deve ser feito para ampliar os esforços, para que todos os países possam alcançar os seus compromissos e ajudar, em nível global, o avanço dessa agenda da biodiversidade.
IHU On-Line – Deseja acrescentar algo?
Bráulio Dias – No site da convenção também é possível encontrar a lista de todos os países que assinaram o compromisso de ratificar o Protocolo, bem como a lista de todos os países que já depositaram seus instrumentos de ratificação. Há também uma série de documentos que elaboramos com parceiros, que são pequenos resumos informativos de natureza mais política para os setores usuários da biodiversidade, para que eles entendam melhor qual é a importância do Protocolo de Nagoya.
(Por Patricia Fachin)

Dia da Sobrecarga da Terra (Earth Overshoot Day) chega cada ano mais cedo, diz WWF

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http://www.ihu.unisinos.br/noticias/534575-dia-da-sobrecarga-da-terra-earth-overshoot-day-chega-cada-ano-mais-cedo-diz-wwf


Dia da Sobrecarga da Terra (Earth Overshoot Day) chega cada ano mais cedo, diz WWF

Com base em estatísticas oficiais de 150 países, o World Wide Fund For Nature (WWF) e o think tank internacional Global Footprint Network registraram nesta terça-feira (19/08) o Dia da Sobrecarga da Terra (Earth Overshoot Day) de 2014 – um dia antes que no ano anterior. Ele marca o momento em que a humanidade consumiu todos os recursos naturais produzidos pelo planeta no decorrer de 12 meses.
A entrevista é de Charlotta Lomas, publicada pela Deutsche Welle, e reproduzida pelo portal EcoDebate, 22-08-2014.
De 5 de outubro em 2000 a 19 de agosto em 2014, o dia em que a humanidade esgota seu orçamento ecológico anual vem chegando cada vez mais cedo, a cada ano. O WWF e o Global Footprint também publicam há 40 anos o relatório bianualLiving Planet (Planeta vivo), sobre o consumo de recursos naturais. Sua edição mais recente sairá em setembro.
A Deutsche Welle entrevistou a respeito Jörg-Andreas Krüger, chefe do Departamento de Biodiversidade do fundo mundial pela natureza WWF na Alemanha.
Eis a entrevista.
Ele nasceu de uma ideia do movimento ambientalista. Queríamos criar um sistema de informação que mostrasse ao público e aos tomadores de decisões a necessidade de, no futuro, refletir mais sobre nossas resoluções.
A cada dois anos, publicamos o relatório Living Planet, como indicador da situação da biodiversidade global. Além disso, oDia da Sobrecarga da Terra mostra como estamos administrando nossos recursos naturais.
Qual é então, essa “cota de recursos” disponível na natureza?
É uma soma total do que usamos em termos de áreas aráveis ou de construção, do que desmatamos, o que pescamos nos rios e oceanos, e naturalmente o dióxido de carbono que emitimos na atmosfera, por todas as atividades da economia. Portanto, é a totalidade do nosso consumo de matérias-primas naturais e renováveis.
Para estabelecê-lo, precisamos medir os recursos globais que a Terra produz e o que pode colocar à disposição dos seres humanos. Em comparação com o que usamos efetivamente, essa é a “pegada ecológica” que deixamos.
O Dia da Sobrecarga da Terra chega a cada ano mais cedo. Por quê?
Simplesmente por usarmos cada vez mais recursos naturais e renováveis.
Quem é responsável pelo aumento do consumo?
Por um lado, podemos colocar a culpa em quem toma decisões – nos políticos, portanto. Por outro, podemos responsabilizar consumidores ao redor do mundo. Em termos do consumo de recursos naturais, numa comparação global notam-se grandes diferenças entre os países.
Por exemplo, se cada pessoa no mundo consumisse como um alemão, precisaríamos de 2,6 planetas. Na comparação com os Estados Unidos, até mesmo quatro planetas.
Há países, principalmente na África e na Ásia, cujos habitantes vivem abaixo da capacidade de recursos naturais. Quer dizer: as nações industrializadas consomem adicionalmente as reservas dos outros países, e ainda exportam a pegada ecológica delas. Um país como a China, por exemplo, chegou ao limite da sua biocapacidade, e a demanda continua a crescer.
Um grande problema para o futuro!
O que diz o relatório Living Planet 2014, a ser divulgado no próximo mês?
Que os cidadãos dos países industrializados deveriam usar os recursos de maneira mais eficiente. Vamos ver que a pegada ecológica cresceu mais uma vez. A pegada ecológica das nações abastadas, porém, não aumentou nos últimos 40 anos. Atualmente identificamos um aumento nos países de renda média, ou seja, os antigos países em desenvolvimento, como os do Brics. Isso é perigoso para a Terra e um grande desafio para a política, pois são países populosos.
Qual é o impacto desse consumo excessivo sobre o meio ambiente?
Há uma enorme perda de biodiversidade. As florestas estão minguando. Há muitas regiões com enormes problemas de abastecimento de água, e a mudança climática tem um grande impacto sobre a agricultura, os solos e o nosso ecossistema como um todo.
O que precisa acontecer para conseguirmos sair dessa “zona vermelha”?
Precisamos de uma indústria mais eficiente. Não podemos continuar a desperdiçar recursos naturais como no passado. Devemos alocar as verbas em investimentos sustentáveis. E necessitamos de um controle mais rigoroso por parte dos governos, que devem tomar decisões corretas em favor da sustentabilidade. Além disso, cada consumidor individual deve agir de forma mais inteligente.
O que cada um de nós pode fazer?
Pode-se, por exemplo, usar energias renováveis e comprar produtos que sejam sustentáveis. Devemos comprar apenas o tanto de que precisamos e o que podemos usar.

Saturday, 23 August 2014

Protocolo de Nagoya vai entrar em vigor sem o Brasil

ihu
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Protocolo de Nagoya vai entrar em vigor sem o Brasil

O acordo sobre biodiversidade estabelece regras para uso dos recursos e divisão dos lucros obtidos. Devido à oposição da bancada ruralista, Brasil está de fora.
A reportagem é Clarissa Neher e publicada por Deutsche Welle, 20-08-2014.
Em outubro, 50 países e a União Europeia (UE) vão se reunir para definir pontos em aberto de uma importante arma no combate à biopirataria, o Protocolo de Nagoya. O Brasil, entretanto, ficará de fora dessas negociações porque ainda não ratificou o documento, o que pode prejudicar os interesses nacionais.
"Ao não participar, o Brasil vai ter dificuldades para defender seus interesses. Um país como o Brasil, que é tão complexo, grande e onde a biodiversidade é tão importante, não poderia ficar a reboque das decisões de outros países", opina o secretário-executivo da Convenção sobre Diversidade Biológica (CBD) da ONU, Bráulio Ferreiras de Souza Dias.
O primeiro encontro dos países-membros da CBD que ratificaram o protocolo será realizado durante a reunião da Conferência das Partes – órgão decisório máximo da CDB – que acontece em outubro na Coreia do Sul. Na reunião serão discutidas regras e procedimentos para o cumprimento do protocolo, mecanismos para sua implementação e financiamento, além de questões que não estão bem definidas no texto.
"Nós temos a maior biodiversidade do mundo, mas, além disso, nosso setor agrícola depende de espécies que não são nativas, por isso seria do nosso interesse estar lá para discutir como isso vai ser regulamentado", afirma o biólogo Carlos Joly, da Unicamp, que integra a Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos.
Joly cita o desenvolvimento de novas variedades de espécies, que eventualmente precisariam de recursos genéticos de espécies vindas de outros países, como exemplo de um ponto que não está totalmente claro no texto, apesar de representantes da ONU afirmarem que essa regulamentação não cabe ao protocolo.
"Vamos ver outros países, até menos importantes do ponto de vista da biodiversidade, tomando decisões. Vamos acabar tendo que cumprir coisas muito difíceis de serem mudadas no futuro", opina a secretária-geral do WWF BrasilMaria Cecília de Brito.
Oposição do setor agropecuário
Argumentos ligados à agricultura estão sendo usados para barrar a ratificação do protocolo no país. Em junho de 2012, o documento foi enviado pela Presidência da República ao Congresso Nacional. Mas, devido a pontos considerados polêmicos pela bancada ruralista, pouco aconteceu desde então.
Quem é contra o protocolo afirma que ele prejudicaria o setor agropecuário, pois quase todas as plantas e animais de interesse da agropecuária brasileira, principalmente os destinados à exportação, como soja e gado, são provenientes de outros países. Os oposicionistas alegam que, ao aceitar o acordo, o Brasil teria que pagar royalties por essas espécies.
Mas ambientalistas contestam essa posição afirmando que o protocolo não é retroativo, ou seja, ele engloba somente o que for criado depois que ele entrar em vigor. Além disso, os recursos utilizados na alimentação são regulamentados pelo Tratado Internacional sobre Recursos Fitogenéticos para a Alimentação e a Agricultura.
Para o diretor de políticas públicas do Greenpeace, Sérgio Leitão, o país é o maior prejudicado com a decisão dos ruralistas. "O Brasil se coloca na posição vergonhosa de não ter o texto ratificado e com um grande prejuízo para a defesa daquilo que é seu principal ativo: suas florestas, conhecimentos tradicionais e a riqueza que conseguiu preservar ao longo de sua existência", reforça.
Segundo o assessor especial do Ministério do Meio Ambiente, Luiz Antônio Carvalho, o governo está se esforçando para esclarecer as dúvidas do agronegócio sobre o protocolo e tem grandes expectativas de que o documento seja ratificado em breve.
Acesso e divisão
Protocolo de Nagoya estabelece regras de acesso a recursos da biodiversidade, como também a divisão dos lucros gerados por esses meios. Ele evita, por exemplo, que uma empresa estrangeira patenteie recursos originários do Brasil, como aconteceu com o açaí, patenteado por uma companhia japonesa.
Além disso, o documento determina que os países detentores de recursos genéticos da biodiversidade ou onde vivam comunidades com conhecimentos tradicionais recebam parte dos lucros gerados com a venda de produtos desenvolvidos a partir desses recursos ou conhecimentos.
"Ele deve ser visto com um instrumento que protege os interesses dos detentores da biodiversidade, como também ajuda a dar segurança jurídica para os investimentos em pesquisa e tecnologia e na comercialização de produtos derivados da biodiversidade", completa Dias.
A promotora do Ministério Público do Distrito Federal, Juliana Santilli, reforça que o protocolo garante que as legislações nacionais sobre biodiversidade sejam respeitadas, pois ele garante a soberania dos países para regulamentar o acesso a seus recursos.
Além disso, Santilli lembra que mesmo os países que não ratificaram o protocolo são obrigados a seguí-lo ao negociar com países que o aderiram. O tratado entra em vigor no dia 12 de outubro e será válido para os 51 membros da Convenção sobre Diversidade Biológica que ratificaram o acordo, entre eles Índia, Indonésia, México, Peru, África do Sul, União Europeia, Espanha, Dinamarca, Uruguai e Vietnã.
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Friday, 14 March 2014

Rascunho de novo acordo climático global deverá estar pronto até o fim do ano

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Rascunho de novo acordo climático global deverá estar pronto até o fim do ano

Os 200 países reunidos para a primeira rodada de negociações climáticas de 2014, sendo realizada na cidade alemã de Bonn, ainda estão divididos, porém concordaram que em junho será feita uma nova reunião e que pelo menos um rascunho do novo acordo climático estará à disposição da Conferência das Partes da Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de Lima (COP 20), agendada para dezembro no Peru.
A reportagem é de Fabiano Ávila, publicada pelo sítio Carbono Brasil, 13/03/2014.
A decisão, apesar de tímida, parece ser um avanço, visto que, desde o começo do encontro em Bonn, a troca de acusações entre países ricos e emergentes tem sido uma constante.
“Devemos começar as negociações sobre o texto. Chega de atrasos”, escreveu Yeb Sano, um dos diplomatas dasFilipinas, em uma rede social.
Para debater o texto do rascunho foram criados grupos de trabalhos menores, o que tornaria os debates mais ágeis. Daqui a três meses, outra reunião deverá avaliar os avanços conseguidos.
Mas mesmo elaborar um rascunho é uma tarefa dificílima, já que cada país defende seus próximos interesses.
Na imagem abaixo (disponibilizada por Sébastien Duyck, pesquisador do Arctic Centre), é possível ver uma parte do rascunho sendo trabalhado. O texto ainda está repleto de colchetes, indicando os trechos nos quais não há consenso.
Fonte: Instituto Carbono Brasil

 
Os países emergentes seguem exigindo que o novo acordo siga o modelo do Protocolo de Quioto, fazendo distinção entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, enquanto os Estados Unidos e outras nações ricas afirmam que esse modelo não faz mais sentido.
Em um exemplo dessa divisão, a delegação brasileira, segundo o portal RTCC, se negou a discutir limites para emissões de gases do efeito estufa, argumentando que EUAAlemanha e Reino Unido contribuíram mais para a elevação das temperaturas do que 100 outros países juntos.
Essa posição é a mesma que a da China e de outros emergentes, sendo que um delegado da Arábia Saudita declarou que o aquecimento global é culpa dos países que começaram a se desenvolver no século XIX.
Por sua vez, os EUA acreditam que não há a menor chance de o acordo ser bem sucedido em frear o aquecimento global se as emissões chinesas, indianas e brasileiras não forem controladas. A China é hoje o maior emissor do planeta e os emergentes são os que mais têm acelerado a liberação de gases.
A decisão de tentar ignorar essas diferenças e partir para a elaboração do texto não chegou a ser contestada, mas foi criticada.
O principal negociador russo, Oleg Shamanov, disse que é uma solução artificial e que terá pouco impacto nas negociações, deixando claro que, se o rascunho do acordo não levar em conta os interesses do seu país, a Rússia não o assinará.
“Por que estamos fazendo isso? É apenas para mandar um sinal para a opinião pública de que estamos avançando?”, perguntou Shamanov.
O novo acordo climático global deve ser finalizado até 2015, para que todos os países tenham tempo de aprová-lo em seus congressos nacionais antes de 2020, data em que expira o Protocolo de Quioto.
A rodada de Bonn segue até a sexta-feira (14).