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http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/patrimonio-cultural-e-natural-mais-um-tema-ignorado-na-rio20-entrevista-especial-com-silvia-zanirato/510945-patrimonio-cultural-e-natural-mais-um-tema-ignorado-na-rio20-entrevista-especial-com-silvia-zanirato
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“O maior desafio é o de se ter vontade política suficiente para reverter a situação de exclusão social, de se ter coragem de enfrentar os interesses do mercado imobiliário e considerar o solo não por seu valor de troca, mas pelo valor de uso, uma condição necessária para a sobrevivência digna da humanidade”, declara a historiadora.
Confira a entrevista.
“A exclusão social mundial é um dado: mais de um bilhão de pessoas vivem em extrema pobreza, sendo que uma em cada cinco pessoas no mundo sofre com a falta de comida”, diz Silvia Zanirato à IHU On-Line. Uma proposta para combater essa condição, informa, foi formulada pelos participantes da Cúpula dos Povos, que sugeriram a “criação de uma taxa sobre transações financeiras”. No entanto, lamenta, “esse desejo foi frustrado no documento aprovado na plenária da Rio+20, que não considerou a possibilidade de financiamento para a proteção social e postergou, para 2015, a proposta de deliberação de um percentual do PIB para os países em desenvolvimento”. Por causa de decisões como essas,Zanirato avalia que a conferência “expressou a falta de vontade de governos de construir uma governança global para o combate à pobreza e postergou, uma vez mais, decisões sobre o assunto”.
Na entrevista a seguir, concedida por e-mail para a IHU On-Line, a pesquisadora também aborda o conceito de patrimônio cultural e natural como uma alternativa para propor moradias sustentáveis, e sugere que os imóveis patrimonializados e protegidos por políticas públicas sejam habitados por pessoas que vivem em moradias inadequadas. “Essas edificações assim como outras que estão nesses espaços, muitas vezes abandonadas e degradadas, podem e devem ser reabilitadas e tornadashabitação de interesse social. Para isso, há uma série de desafios a serem transpostos, desde aqueles que envolvem os interesses do mercado imobiliário a outros como a concepção elitista a respeito do patrimônio cultural edificado, que deve ser considerado por seus múltiplos usos, entre os quais o residencial”, avalia.
Silvia Zanirato (foto abaixo) é doutora em História pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, especialista em Gestão do Patrimônio Cultural Integrado pela Universidade Federal de Pernambuco e pós-doutora em Geografia Política pela Universidade de São Paulo – USP, e em História pela Universidad de Sevilla. Atualmente leciona no Curso de Gestão Ambiental, no Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais, e no Programa de Pós-Graduação em Mudança Social e Participação Política, da USP. Atua como professora colaboradora no mestrado em História na Universidade Estadual de Maringá. Também é professora convidada do máster em Gestion del Patrimonio Urbano Latinoamericano y Andaluz, da Universidad de Sevilla.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Em que consiste os conceitos de patrimônio cultural e natural, e como eles são interpretados a partir dos dilemas ambientais em pauta neste momento?
Silvia Zanirato – O patrimônio é um conceito muito amplo e nele se inscrevem os bens culturais e naturais, ainda que nem sempre essa acepção seja considerada. Não é algo circunscrito às criações físicas do homem, nem somente a algo monumental, excepcional do ponto de vista da história, da arte, da estética. Ele é formado por uma série de elementos naturais e culturais, materiais e imateriais que registram os modos de vida ao longo do tempo. Nesse entendimento o ambiente é um patrimônio porque nele se desenvolvem diferentes formas de vida. O patrimônio também não se limita aos bens reconhecidos e protegidos por leis. Mesmo aqueles que não se encontram nessa condição podem ser considerados patrimônio porque há neles valores afetivos, de existência, de identidade.
Os grandes dilemas ambientais são a manutenção da biodiversidade, a redução da pobreza, o controle das emissões de carbono. Em todos esses aspectos o patrimônio e sua proteção se encontram. No âmbito natural, por exemplo, a conservação da biodiversidade ocorre através da criação e efetiva proteção de unidades de conservação, que são repositórios do patrimônio. Em se tratando da redução da pobreza, a utilização do patrimônio cultural edificado encontrado na maioria das grandes cidades latino-americanas é outra possibilidade. Não se pode esquecer que os centros históricos de boa parte das cidades latino-americanas contam com uma série de edificações vazias e degradadas, que podem e devem ser reabilitadas e tornadas habitação de interesse social para a inclusão da pobreza. Este é o sentido que vejo no patrimônio, o de ser disponibilizado para os que dele necessitam.
É numa perspectiva holística que isso se coloca, a de defender os usos sociais dos patrimônios. Para isso há uma necessidade de superar a visão monumentalista e o hábito de só investir em salvaguarda de bens na expectativa de retorno do investimento, muitas vezes resultantes da exposição ao turismo. Uma visão integrada do patrimônio pressupõe atribuir funções compatíveis aos usos sociais em incorporar a população pobre que habita lugares onde há edificações patrimonializadas e disponibilizá-los de forma a garantir a ela uma moradia digna.
IHU On-Line – Em que consiste o uso sustentável do patrimônio cultural? Como esse debate repercute no Brasil e no mundo?
Silvia Zanirato – O uso sustentável pressupõe os usos sociais do patrimônio, ou seja, a participação da sociedade na conservação desse bem. Não é possível que haja, como é o caso de lugares patrimonializados nos centros das cidades de Salvador e Recife, um número grande de imóveis protegidos por políticas públicas e sem uso, em paralelo a um número contingente de pessoas vivendo em moradias inadequadas. Essas edificações assim como outras que estão nesses espaços, muitas vezes abandonadas e degradadas, podem e devem ser reabilitadas e tornadas habitação de interesse social. Para isso há uma série de desafios a serem transpostos, desde aqueles que envolvem os interesses do mercado imobiliário a outros como a concepção elitista a respeito do patrimônio cultural edificado, que deve ser considerado por seus múltiplos usos, entre os quais o residencial.
Investir nessa direção também deve ser considerado como uma forma de reverter os padrões de expansão horizontal das cidades – em melhor aproveitar a infraestrutura e serviços encontrados em inúmeros centros antigos que se mantêm ociosos ou subutilizados e assim aproveitar as redes de transporte, o acesso a serviços, sistemas de água e energia –, algo crucial no processo de evitar ou restringir infraestruturas com alta emissão de carbono, em reduzir o contingente populacional que vive em habitações subnormais e em caminhar em direção aos objetivos do milênio.
IHU On-Line – Na Rio+20 e a na Cúpula dos Povos, houve espaço para discutir o patrimônio cultural e natural? Como aconteceu esse debate?
Silvia Zanirato – Houve pouco espaço. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN realizou uma sessão de debates no Palácio Capanema – um evento paralelo – a respeito da conservação e recuperação do meio ambiente e do acesso à cultura como fator de promoção social. Houve também alguns debates e experiências apresentadas pelo Fórum Nacional de Reforma Urbana, a Habitat International Coalition – HIC e a Alianza Internacional de los Habitantes – AIH na Cúpula dos Povos, que expuseram projetos habitacionais que contemplam a habitação de interesse social e que defendem a não mercantilização da moradia e o direito à cidade. Mas a inclusão social pela garantia de uma moradia digna e pela possibilidade de usos do patrimônio cultural edificado foi um assunto pouco tratado. O debate se restringiu a algumas iniciativas de pesquisadores que trabalham com essa temática, como é o meu caso, que pude tratar dessa questão com outros pesquisadores da Universidade de São Paulo e do Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicadas – Ipea. A mesa-redonda que abordou esse assunto ocorreu no dia 14 de junho, na Arena da Barra. Por ser o segundo dia do evento e por não estar nos locais de maior destaque (Riocentro e Aterro do Flamengo), a presença de um público mais amplo para repercutir o assunto deixou a desejar.
IHU On-Line – Em que medida dois dos temas centrais da Rio+20, a governança global e economia verde como alternativa para erradicar a pobreza, se relacionam com o conceito de patrimônio cultural e natural?
Silvia Zanirato – A Rio+20 teve como propósito avaliar o cumprimento dos compromissos multilaterais adotados nos últimos 20 anos que remetem à Eco-92 e aos Objetivos e Metas de Desenvolvimento do Milênio. Na ocasião se buscou avaliar em que medida foi possível caminhar em direção a um desenvolvimento sustentável e eficiente na promoção do bem-estar humano e ambiental.
Um dos temas abordados é aquele que reportou aos esforços para erradicar a exclusão social e reduzir a pobreza. Gerar oportunidades para o desenvolvimento econômico e diminuição da pobreza sem liquidar ou acabar com os bens naturais de um país é o grande desafio apresentado pelo PNUMA.
Entre o conjunto de premissas e recomendações em favor da melhoria da qualidade de vida da população pobre está o de mudar os tipos de assentamentos a ela destinados. Essa preocupação aparece na Agenda 21 e nos objetivos daCúpula do Milênio, que estabeleceram metas a serem cumpridas até 2015 para tornar o mundo mais solidário e justo. Entre essas metas está a implementação de políticas capazes de garantir o direito à habitação digna a todas as pessoas. A expectativa é a de atingir, até 2020, uma melhora significativa na vida de pelo menos 100 milhões de pessoas que se encontram em assentamentos precários. Isso equivale a reduzir pela metade o contingente que vive em tais condições.
Nesse sentido, o patrimônio cultural edificado existente nos centros das cidades, muitas vezes em avançado estado de degradação, ou mesmo recuperado por políticas públicas de promoção do patrimônio cultural, mas ainda assim sem usohabitacional, entra como uma alternativa. É possível destinar esses espaços para a população sem moradia digna. Já há experiências nessa direção, por exemplo em Quito, no Equador, que atestam essa possibilidade. Já há também um saber acumulado em experiências de que isso implica programas de subsídio a habitações sociais que possibilitem o acesso à população de baixa renda a uma habitação digna.
IHU On-Line – Que modelo de governança e de desenvolvimento seria necessário para dar conta dessa questão do patrimônio?
Silvia Zanirato – Quando se fala em governança, pensa-se na diversificação de atores envolvidos nas discussões sobre temas como meio ambiente e sustentabilidade. Isso significa ampliar a participação de setores da sociedade que não participam do debate político. Em se tratando do patrimônio, ainda que tenha havido uma ampliação da participação da sociedade em conselhos municipais, por exemplo, ainda permanece uma visão elitista do patrimônio que o vê mais como um bem a ser contemplado, e não como um bem que deve ter uma função social. Somente o reconhecimento da função social do patrimônio permite posturas capazes de enfrentar os interesses do mercado imobiliário, as políticas de ordenação do espaço, a concepção monumentalista e excludente do patrimônio cultural edificado. Nesse sentido, destaco a necessidade de prosseguir apostando no disposto pela Emenda Constitucional nº 26/2000, que afirma a moradia como um direito social, expresso no Artigo 6, no capítulo dos Direitos e Garantias Fundamentais da Constituição de 1988. Em acordo com o artigo 182, §2º dessa Constituição, a "propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade, expressas no plano diretor".
Esse princípio, seguido do artigo 39 do Estatuto da Cidade (que regulamenta o capítulo de política urbana na ordem econômica da Constituição de 1988), expressa que a propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às necessidades dos munícipes em relação à justiça social e à qualidade de vida. São esses dispositivos que permitiram a aprovação da Lei nº 11.124/2005, que instituiu o Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social e que considerou que os imóveis públicos vagos ou abandonados que não estão cumprindo sua função social devam ser canalizados para as habitações de interesse social. A habitação de interesse social procura definir soluções de moradia voltada para a população de baixa renda (famílias com renda mensal de até cinco salários mínimos).
Pôr em prática esses dispositivos é um desafio e uma forma de acabar com o estoque imobiliário sem uso, presente nos centros históricos das cidades do Brasil e, ao mesmo tempo, promover a inclusão social.
IHU On-Line – Como avalia as discussões acerca da governança global e da inclusão social na Rio+20 e na Cúpula dos Povos?
Silvia Zanirato – A exclusão social mundial é um dado: mais de um bilhão de pessoas vive em extrema pobreza, sendo que uma em cada cinco pessoas no mundo sofre com a falta de comida. Esses números expressam o tamanho do desafio. Por isso mesmo o combate a essa condição não pode prescindir de uma ação global de financiamento pelos países ricos aos países em desenvolvimento para a implementação de mecanismo de proteção social. No entanto, como é sabido, a alegação de vários representantes dos Estados na Conferência foi a de que não há recursos para financiar essa transformação. A expectativa defendida em várias falas do movimento sindical e social de vários países, na Cúpula dos Povos e mesmo na Rio Dialogues, foi a da criação de uma taxa sobre transações financeiras. Esse desejo foi frustrado no documento aprovado na plenária da Rio+20, que não considerou a possibilidade de financiamento para a proteção social e postergou, para 2015, a proposta de deliberação de um percentual do PIB para os países em desenvolvimento. Nesse sentido, o encontro expressou a falta de vontade de governos de construir uma governança global para o combater à pobreza e postergou, uma vez mais, decisões sobre o assunto.
IHU On-Line – Que programas brasileiros contemplam a conservação do patrimônio cultural? Nesse sentido, quais são hoje as políticas públicas que consideram essa temática?
Silvia Zanirato – As políticas que consideram essa temática são políticas conjugadas de promoção da moradia e de conservação do patrimônio cultural. São três programas que contemplam essa questão e veem o patrimônio cultural comomoradia, recorrendo para tanto aos entendimentos sobre habitação de interesse social: o Programa de Arrendamento Residencial (PAR), o Programa Nacional de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais e o Programa de Aceleração do Crescimento das Cidades Históricas (PAC – Cidades Históricas).
Programas
O primeiro é um programa criado em 1999, com a expectativa de atender às necessidades de moradia da população de baixa renda – entre 3 e 8 salários. Ele visa à promoção de habitação social nas áreas centrais, através da reutilização de antigas estruturas para o uso habitacional. Inicialmente funcionava como um leasing, por um período de 15 anos, com opção de compra ao final do prazo contratado. A Caixa Econômica Federal permanecia como proprietária fiduciária do imóvel durante o período do arrendamento. Em maio de 2007 essa norma foi alterada e possibilitou a transformação do Programa em um financiamento convencional.
No entanto, há dificuldades em fazer funcionar esse Programa. Uma delas se explica pelo valor do financiamento. Em 2008 o valor da taxa de arrendamento estava em torno de R$ 200,00, um valor inferior a um aluguel de um imóvel com as mesmas condições de habitabilidade e de localização. O valor máximo para a compra estava em R$ 40.000,00. Disso resultou que, até abril de 2008, foram financiadas apenas 1.425 unidades em 26 edifícios localizados nas áreas centrais de São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Porto Alegre e Pelotas.
Em 2011 o valor máximo para financiamento de imóvel em São Paulo e Rio de Janeiro foi reajustado para 48.000,00 reais a fim de beneficiar famílias com renda mensal de até 2.200,00 reais. Novamente um valor inferior ao que o mercado estabelece.
Também na relação entre patrimônio e habitação de interesse social há o Programa Nacional de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais, criado em 2003, com o objetivo de enfrentar o problema do esvaziamento dos centros das cidades, combater a subutilização da infraestrutura existente, a perda do valor econômico dos imóveis e a degradação do patrimônio cultural.
O Programa procurou destinar imóveis públicos para habitação de interesse social e elaborar e implementar um serviço de moradia social através da locação social. Para isso foi assinada em abril de 2006 uma Medida Provisória que visava retirar entraves jurídicos e aperfeiçoar a legislação patrimonial, desburocratizando a entrega de títulos de propriedade de imóveis vazios e subtilizados às famílias de baixa renda. Mas a ação se efetivou em alguns imóveis públicos pertencentes ao INSS, à RFFSA e à União.
Competências municipais
Paralelamente a isso, a gestão do uso e ocupação do solo bem como a política urbanística são competências municipais, pois é o município, através do Plano Diretor e de legislação pertinente, que deve impor ao proprietário de área subutilizada ou não utilizada a utilização do imóvel, de modo a induzir a ocupação de áreas já dotadas de infraestrutura e equipamentos. Isso também impede a efetividade das ações, pois muitas vezes o município não tem conhecimento ou força política suficiente para fazer valer a utilização de imóveis e a implantação desse Programa.
O terceiro programa é o Programa de Aceleração do Crescimento das Cidades Históricas, que visa a atuar em 173 cidades, localizadas em todos os estados brasileiros, que tenham lugares registrados como Patrimônio Cultural do Brasil. O objetivo do PAC – Cidades Históricas é o de promover a reabilitação de imóveis e a requalificação de espaços urbanos onde haja imóveis protegidos como patrimônio e viabilizar ações de saneamento ambiental, de melhoria do transporte público. Há também a preocupação com a implantação de habitações sociais nesses espaços, o que é considerado como uma forma de inclusão social e também um meio para estancar os processos de esvaziamento populacional e funcional de centros históricos. Num primeiro momento, 187 cidades se candidataram, 141 finalizaram a elaboração no primeiro ano do programa, e 110 assinaram os acordos de execução.
Desafios
Segundo o IPHAN e o Ministério das Cidades, uma análise preliminar das propostas mostra as dificuldades dos municípios quanto à definição de estratégias para implementação das ações e a necessidade de capacitação de gestores e técnicos, de modo a definir estratégias adequadas ao perfil das cidades.
Para piorar ainda mais, no primeiro ano do PAC – Cidades Históricas houve uma forte limitação de recursos, resultante da contenção orçamentária do governo federal.
Todos esses entraves revelam as dificuldades existentes ao se relacionar políticas urbanas com conservação do patrimônio. Revelam também os entraves relativos ao combate à pobreza, elementos que ainda permanecem como secundários às políticas públicas.
IHU On-Line – Quais os principais desafios das cidades do Brasil e do mundo, em geral, quanto à moradia a partir desta visão de sustentabilidade?
Silvia Zanirato – O maior desafio é o de se ter vontade política suficiente para reverter a situação de exclusão social, de se ter coragem de enfrentar os interesses do mercado imobiliário e considerar o solo não por seu valor de troca, mas pelo valor de uso, uma condição necessária para a sobrevivência digna da humanidade. Enfrentar esses desafios é a condição para se implementar políticas capazes de mudar essa situação e garantir o direito à habitação digna aos excluídos.
É sabido que a inexistência de políticas eficazes de acesso à moradia para a população pobre e a baixa renda por ela usufruída têm como consequência sua incapacidade em pagar os custos de uma habitação mais adequada, o endividamento, a restrição de suas escolhas no mercado habitacional e a ocupação de moradias inadequadas em assentamentos informais. Resta a ela os cortiços, as favelas, os loteamentos clandestinos.
Confira a entrevista.
“A exclusão social mundial é um dado: mais de um bilhão de pessoas vivem em extrema pobreza, sendo que uma em cada cinco pessoas no mundo sofre com a falta de comida”, diz Silvia Zanirato à IHU On-Line. Uma proposta para combater essa condição, informa, foi formulada pelos participantes da Cúpula dos Povos, que sugeriram a “criação de uma taxa sobre transações financeiras”. No entanto, lamenta, “esse desejo foi frustrado no documento aprovado na plenária da Rio+20, que não considerou a possibilidade de financiamento para a proteção social e postergou, para 2015, a proposta de deliberação de um percentual do PIB para os países em desenvolvimento”. Por causa de decisões como essas,Zanirato avalia que a conferência “expressou a falta de vontade de governos de construir uma governança global para o combate à pobreza e postergou, uma vez mais, decisões sobre o assunto”.
Na entrevista a seguir, concedida por e-mail para a IHU On-Line, a pesquisadora também aborda o conceito de patrimônio cultural e natural como uma alternativa para propor moradias sustentáveis, e sugere que os imóveis patrimonializados e protegidos por políticas públicas sejam habitados por pessoas que vivem em moradias inadequadas. “Essas edificações assim como outras que estão nesses espaços, muitas vezes abandonadas e degradadas, podem e devem ser reabilitadas e tornadashabitação de interesse social. Para isso, há uma série de desafios a serem transpostos, desde aqueles que envolvem os interesses do mercado imobiliário a outros como a concepção elitista a respeito do patrimônio cultural edificado, que deve ser considerado por seus múltiplos usos, entre os quais o residencial”, avalia.
Silvia Zanirato (foto abaixo) é doutora em História pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, especialista em Gestão do Patrimônio Cultural Integrado pela Universidade Federal de Pernambuco e pós-doutora em Geografia Política pela Universidade de São Paulo – USP, e em História pela Universidad de Sevilla. Atualmente leciona no Curso de Gestão Ambiental, no Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais, e no Programa de Pós-Graduação em Mudança Social e Participação Política, da USP. Atua como professora colaboradora no mestrado em História na Universidade Estadual de Maringá. Também é professora convidada do máster em Gestion del Patrimonio Urbano Latinoamericano y Andaluz, da Universidad de Sevilla.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Em que consiste os conceitos de patrimônio cultural e natural, e como eles são interpretados a partir dos dilemas ambientais em pauta neste momento?
Silvia Zanirato – O patrimônio é um conceito muito amplo e nele se inscrevem os bens culturais e naturais, ainda que nem sempre essa acepção seja considerada. Não é algo circunscrito às criações físicas do homem, nem somente a algo monumental, excepcional do ponto de vista da história, da arte, da estética. Ele é formado por uma série de elementos naturais e culturais, materiais e imateriais que registram os modos de vida ao longo do tempo. Nesse entendimento o ambiente é um patrimônio porque nele se desenvolvem diferentes formas de vida. O patrimônio também não se limita aos bens reconhecidos e protegidos por leis. Mesmo aqueles que não se encontram nessa condição podem ser considerados patrimônio porque há neles valores afetivos, de existência, de identidade.
Os grandes dilemas ambientais são a manutenção da biodiversidade, a redução da pobreza, o controle das emissões de carbono. Em todos esses aspectos o patrimônio e sua proteção se encontram. No âmbito natural, por exemplo, a conservação da biodiversidade ocorre através da criação e efetiva proteção de unidades de conservação, que são repositórios do patrimônio. Em se tratando da redução da pobreza, a utilização do patrimônio cultural edificado encontrado na maioria das grandes cidades latino-americanas é outra possibilidade. Não se pode esquecer que os centros históricos de boa parte das cidades latino-americanas contam com uma série de edificações vazias e degradadas, que podem e devem ser reabilitadas e tornadas habitação de interesse social para a inclusão da pobreza. Este é o sentido que vejo no patrimônio, o de ser disponibilizado para os que dele necessitam.
É numa perspectiva holística que isso se coloca, a de defender os usos sociais dos patrimônios. Para isso há uma necessidade de superar a visão monumentalista e o hábito de só investir em salvaguarda de bens na expectativa de retorno do investimento, muitas vezes resultantes da exposição ao turismo. Uma visão integrada do patrimônio pressupõe atribuir funções compatíveis aos usos sociais em incorporar a população pobre que habita lugares onde há edificações patrimonializadas e disponibilizá-los de forma a garantir a ela uma moradia digna.
IHU On-Line – Em que consiste o uso sustentável do patrimônio cultural? Como esse debate repercute no Brasil e no mundo?
Silvia Zanirato – O uso sustentável pressupõe os usos sociais do patrimônio, ou seja, a participação da sociedade na conservação desse bem. Não é possível que haja, como é o caso de lugares patrimonializados nos centros das cidades de Salvador e Recife, um número grande de imóveis protegidos por políticas públicas e sem uso, em paralelo a um número contingente de pessoas vivendo em moradias inadequadas. Essas edificações assim como outras que estão nesses espaços, muitas vezes abandonadas e degradadas, podem e devem ser reabilitadas e tornadas habitação de interesse social. Para isso há uma série de desafios a serem transpostos, desde aqueles que envolvem os interesses do mercado imobiliário a outros como a concepção elitista a respeito do patrimônio cultural edificado, que deve ser considerado por seus múltiplos usos, entre os quais o residencial.
Investir nessa direção também deve ser considerado como uma forma de reverter os padrões de expansão horizontal das cidades – em melhor aproveitar a infraestrutura e serviços encontrados em inúmeros centros antigos que se mantêm ociosos ou subutilizados e assim aproveitar as redes de transporte, o acesso a serviços, sistemas de água e energia –, algo crucial no processo de evitar ou restringir infraestruturas com alta emissão de carbono, em reduzir o contingente populacional que vive em habitações subnormais e em caminhar em direção aos objetivos do milênio.
IHU On-Line – Na Rio+20 e a na Cúpula dos Povos, houve espaço para discutir o patrimônio cultural e natural? Como aconteceu esse debate?
Silvia Zanirato – Houve pouco espaço. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN realizou uma sessão de debates no Palácio Capanema – um evento paralelo – a respeito da conservação e recuperação do meio ambiente e do acesso à cultura como fator de promoção social. Houve também alguns debates e experiências apresentadas pelo Fórum Nacional de Reforma Urbana, a Habitat International Coalition – HIC e a Alianza Internacional de los Habitantes – AIH na Cúpula dos Povos, que expuseram projetos habitacionais que contemplam a habitação de interesse social e que defendem a não mercantilização da moradia e o direito à cidade. Mas a inclusão social pela garantia de uma moradia digna e pela possibilidade de usos do patrimônio cultural edificado foi um assunto pouco tratado. O debate se restringiu a algumas iniciativas de pesquisadores que trabalham com essa temática, como é o meu caso, que pude tratar dessa questão com outros pesquisadores da Universidade de São Paulo e do Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicadas – Ipea. A mesa-redonda que abordou esse assunto ocorreu no dia 14 de junho, na Arena da Barra. Por ser o segundo dia do evento e por não estar nos locais de maior destaque (Riocentro e Aterro do Flamengo), a presença de um público mais amplo para repercutir o assunto deixou a desejar.
IHU On-Line – Em que medida dois dos temas centrais da Rio+20, a governança global e economia verde como alternativa para erradicar a pobreza, se relacionam com o conceito de patrimônio cultural e natural?
Silvia Zanirato – A Rio+20 teve como propósito avaliar o cumprimento dos compromissos multilaterais adotados nos últimos 20 anos que remetem à Eco-92 e aos Objetivos e Metas de Desenvolvimento do Milênio. Na ocasião se buscou avaliar em que medida foi possível caminhar em direção a um desenvolvimento sustentável e eficiente na promoção do bem-estar humano e ambiental.
Um dos temas abordados é aquele que reportou aos esforços para erradicar a exclusão social e reduzir a pobreza. Gerar oportunidades para o desenvolvimento econômico e diminuição da pobreza sem liquidar ou acabar com os bens naturais de um país é o grande desafio apresentado pelo PNUMA.
Entre o conjunto de premissas e recomendações em favor da melhoria da qualidade de vida da população pobre está o de mudar os tipos de assentamentos a ela destinados. Essa preocupação aparece na Agenda 21 e nos objetivos daCúpula do Milênio, que estabeleceram metas a serem cumpridas até 2015 para tornar o mundo mais solidário e justo. Entre essas metas está a implementação de políticas capazes de garantir o direito à habitação digna a todas as pessoas. A expectativa é a de atingir, até 2020, uma melhora significativa na vida de pelo menos 100 milhões de pessoas que se encontram em assentamentos precários. Isso equivale a reduzir pela metade o contingente que vive em tais condições.
Nesse sentido, o patrimônio cultural edificado existente nos centros das cidades, muitas vezes em avançado estado de degradação, ou mesmo recuperado por políticas públicas de promoção do patrimônio cultural, mas ainda assim sem usohabitacional, entra como uma alternativa. É possível destinar esses espaços para a população sem moradia digna. Já há experiências nessa direção, por exemplo em Quito, no Equador, que atestam essa possibilidade. Já há também um saber acumulado em experiências de que isso implica programas de subsídio a habitações sociais que possibilitem o acesso à população de baixa renda a uma habitação digna.
IHU On-Line – Que modelo de governança e de desenvolvimento seria necessário para dar conta dessa questão do patrimônio?
Silvia Zanirato – Quando se fala em governança, pensa-se na diversificação de atores envolvidos nas discussões sobre temas como meio ambiente e sustentabilidade. Isso significa ampliar a participação de setores da sociedade que não participam do debate político. Em se tratando do patrimônio, ainda que tenha havido uma ampliação da participação da sociedade em conselhos municipais, por exemplo, ainda permanece uma visão elitista do patrimônio que o vê mais como um bem a ser contemplado, e não como um bem que deve ter uma função social. Somente o reconhecimento da função social do patrimônio permite posturas capazes de enfrentar os interesses do mercado imobiliário, as políticas de ordenação do espaço, a concepção monumentalista e excludente do patrimônio cultural edificado. Nesse sentido, destaco a necessidade de prosseguir apostando no disposto pela Emenda Constitucional nº 26/2000, que afirma a moradia como um direito social, expresso no Artigo 6, no capítulo dos Direitos e Garantias Fundamentais da Constituição de 1988. Em acordo com o artigo 182, §2º dessa Constituição, a "propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade, expressas no plano diretor".
Esse princípio, seguido do artigo 39 do Estatuto da Cidade (que regulamenta o capítulo de política urbana na ordem econômica da Constituição de 1988), expressa que a propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às necessidades dos munícipes em relação à justiça social e à qualidade de vida. São esses dispositivos que permitiram a aprovação da Lei nº 11.124/2005, que instituiu o Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social e que considerou que os imóveis públicos vagos ou abandonados que não estão cumprindo sua função social devam ser canalizados para as habitações de interesse social. A habitação de interesse social procura definir soluções de moradia voltada para a população de baixa renda (famílias com renda mensal de até cinco salários mínimos).
Pôr em prática esses dispositivos é um desafio e uma forma de acabar com o estoque imobiliário sem uso, presente nos centros históricos das cidades do Brasil e, ao mesmo tempo, promover a inclusão social.
IHU On-Line – Como avalia as discussões acerca da governança global e da inclusão social na Rio+20 e na Cúpula dos Povos?
Silvia Zanirato – A exclusão social mundial é um dado: mais de um bilhão de pessoas vive em extrema pobreza, sendo que uma em cada cinco pessoas no mundo sofre com a falta de comida. Esses números expressam o tamanho do desafio. Por isso mesmo o combate a essa condição não pode prescindir de uma ação global de financiamento pelos países ricos aos países em desenvolvimento para a implementação de mecanismo de proteção social. No entanto, como é sabido, a alegação de vários representantes dos Estados na Conferência foi a de que não há recursos para financiar essa transformação. A expectativa defendida em várias falas do movimento sindical e social de vários países, na Cúpula dos Povos e mesmo na Rio Dialogues, foi a da criação de uma taxa sobre transações financeiras. Esse desejo foi frustrado no documento aprovado na plenária da Rio+20, que não considerou a possibilidade de financiamento para a proteção social e postergou, para 2015, a proposta de deliberação de um percentual do PIB para os países em desenvolvimento. Nesse sentido, o encontro expressou a falta de vontade de governos de construir uma governança global para o combater à pobreza e postergou, uma vez mais, decisões sobre o assunto.
IHU On-Line – Que programas brasileiros contemplam a conservação do patrimônio cultural? Nesse sentido, quais são hoje as políticas públicas que consideram essa temática?
Silvia Zanirato – As políticas que consideram essa temática são políticas conjugadas de promoção da moradia e de conservação do patrimônio cultural. São três programas que contemplam essa questão e veem o patrimônio cultural comomoradia, recorrendo para tanto aos entendimentos sobre habitação de interesse social: o Programa de Arrendamento Residencial (PAR), o Programa Nacional de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais e o Programa de Aceleração do Crescimento das Cidades Históricas (PAC – Cidades Históricas).
Programas
O primeiro é um programa criado em 1999, com a expectativa de atender às necessidades de moradia da população de baixa renda – entre 3 e 8 salários. Ele visa à promoção de habitação social nas áreas centrais, através da reutilização de antigas estruturas para o uso habitacional. Inicialmente funcionava como um leasing, por um período de 15 anos, com opção de compra ao final do prazo contratado. A Caixa Econômica Federal permanecia como proprietária fiduciária do imóvel durante o período do arrendamento. Em maio de 2007 essa norma foi alterada e possibilitou a transformação do Programa em um financiamento convencional.
No entanto, há dificuldades em fazer funcionar esse Programa. Uma delas se explica pelo valor do financiamento. Em 2008 o valor da taxa de arrendamento estava em torno de R$ 200,00, um valor inferior a um aluguel de um imóvel com as mesmas condições de habitabilidade e de localização. O valor máximo para a compra estava em R$ 40.000,00. Disso resultou que, até abril de 2008, foram financiadas apenas 1.425 unidades em 26 edifícios localizados nas áreas centrais de São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Porto Alegre e Pelotas.
Em 2011 o valor máximo para financiamento de imóvel em São Paulo e Rio de Janeiro foi reajustado para 48.000,00 reais a fim de beneficiar famílias com renda mensal de até 2.200,00 reais. Novamente um valor inferior ao que o mercado estabelece.
Também na relação entre patrimônio e habitação de interesse social há o Programa Nacional de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais, criado em 2003, com o objetivo de enfrentar o problema do esvaziamento dos centros das cidades, combater a subutilização da infraestrutura existente, a perda do valor econômico dos imóveis e a degradação do patrimônio cultural.
O Programa procurou destinar imóveis públicos para habitação de interesse social e elaborar e implementar um serviço de moradia social através da locação social. Para isso foi assinada em abril de 2006 uma Medida Provisória que visava retirar entraves jurídicos e aperfeiçoar a legislação patrimonial, desburocratizando a entrega de títulos de propriedade de imóveis vazios e subtilizados às famílias de baixa renda. Mas a ação se efetivou em alguns imóveis públicos pertencentes ao INSS, à RFFSA e à União.
Competências municipais
Paralelamente a isso, a gestão do uso e ocupação do solo bem como a política urbanística são competências municipais, pois é o município, através do Plano Diretor e de legislação pertinente, que deve impor ao proprietário de área subutilizada ou não utilizada a utilização do imóvel, de modo a induzir a ocupação de áreas já dotadas de infraestrutura e equipamentos. Isso também impede a efetividade das ações, pois muitas vezes o município não tem conhecimento ou força política suficiente para fazer valer a utilização de imóveis e a implantação desse Programa.
O terceiro programa é o Programa de Aceleração do Crescimento das Cidades Históricas, que visa a atuar em 173 cidades, localizadas em todos os estados brasileiros, que tenham lugares registrados como Patrimônio Cultural do Brasil. O objetivo do PAC – Cidades Históricas é o de promover a reabilitação de imóveis e a requalificação de espaços urbanos onde haja imóveis protegidos como patrimônio e viabilizar ações de saneamento ambiental, de melhoria do transporte público. Há também a preocupação com a implantação de habitações sociais nesses espaços, o que é considerado como uma forma de inclusão social e também um meio para estancar os processos de esvaziamento populacional e funcional de centros históricos. Num primeiro momento, 187 cidades se candidataram, 141 finalizaram a elaboração no primeiro ano do programa, e 110 assinaram os acordos de execução.
Desafios
Segundo o IPHAN e o Ministério das Cidades, uma análise preliminar das propostas mostra as dificuldades dos municípios quanto à definição de estratégias para implementação das ações e a necessidade de capacitação de gestores e técnicos, de modo a definir estratégias adequadas ao perfil das cidades.
Para piorar ainda mais, no primeiro ano do PAC – Cidades Históricas houve uma forte limitação de recursos, resultante da contenção orçamentária do governo federal.
Todos esses entraves revelam as dificuldades existentes ao se relacionar políticas urbanas com conservação do patrimônio. Revelam também os entraves relativos ao combate à pobreza, elementos que ainda permanecem como secundários às políticas públicas.
IHU On-Line – Quais os principais desafios das cidades do Brasil e do mundo, em geral, quanto à moradia a partir desta visão de sustentabilidade?
Silvia Zanirato – O maior desafio é o de se ter vontade política suficiente para reverter a situação de exclusão social, de se ter coragem de enfrentar os interesses do mercado imobiliário e considerar o solo não por seu valor de troca, mas pelo valor de uso, uma condição necessária para a sobrevivência digna da humanidade. Enfrentar esses desafios é a condição para se implementar políticas capazes de mudar essa situação e garantir o direito à habitação digna aos excluídos.
É sabido que a inexistência de políticas eficazes de acesso à moradia para a população pobre e a baixa renda por ela usufruída têm como consequência sua incapacidade em pagar os custos de uma habitação mais adequada, o endividamento, a restrição de suas escolhas no mercado habitacional e a ocupação de moradias inadequadas em assentamentos informais. Resta a ela os cortiços, as favelas, os loteamentos clandestinos.