O Antropoceno representa um novo período da história do Planeta, que a partir da ação humana como força impulsionadora da degradação ambiental acelera o colapso global. Daí a crise sistêmica, pois esse rápido e progressivo avanço na deterioração das condições de vida possui um impacto que gera múltiplas facetas interconectadas em um fenômeno global. E por ser de ordem emergencial, também exige respostas imediatas, audazes, coerentes e catalisadoras de forças desaceleradoras e restaurativas. Uma tarefa nada simples, que exige, como primeiro passo, a compreensão de um cenário nada alentador.
Com o tema “Antropoceno e a crise sistêmica”, José Eustáquio Diniz Alves, sociólogo, mestre em economia e doutor em Demografia, com longa passagem pela Escola Nacional de Ciências Estatísticas, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – ENCE/IBGE, esmiuçou questões centrais que permeiam esse momento inédito, que se apresenta como ameaça existencial para a humanidade e sua travessia civilizatória.
Sua exposição, ocorrida no último sábado, dia 27 de junho, com transmissão online, inaugurou a série de debates intitulada “Ecologia, economia e trabalho no ciclo da vida”, que será promovida mensalmente pelo CEPAT, em parceria com diversos parceiros: Instituto Humanitas Unisinos – IHU, Núcleo de Direitos Humanos da PUCPR, Conselho Nacional do Laicato do Brasil – CNLB, Comunidades de Vida Cristã – CVX e Observatório Nacional Luciano Mendes de Almeida – OLMA.
José Eustáquio Diniz Alves iniciou sua apresentação citando o protagonismo juvenil de Greta Thunberg, fonte de inspiração na luta contra a crise climática, que se tornou símbolo do engajamento das novas gerações nesta luta emergencial. Em determinado momento do debate, também destacou a importância do lançamento da encíclica Laudato Si’, em 2015, que surge em um momento essencial do debate mundial sobre a problemática ecológica.
Também fez menção ao livro de David Wallace-Wells, “A terra inabitável: uma história do futuro”, que apresenta, sem rodeios, um cenário horripilante das consequências da mudança climática, caso não haja uma guinada em nosso modelo de produção e consumo, associado ao crescimento econômico e populacional.
Em contraposição aos negacionistas de plantão, José Eustáquio apresentou análises e estudos estatísticos, valorizando as mais recentes pesquisas científicas, dialogando com as ciências humanas. Entre os temas abordados, destacou o aumento de CO2 e da temperatura global no longo prazo, o crescimento demoeconômico global, a pegada ecológica, a biocapacidade e o déficit ambiental, a perda da biodiversidade, entre outros.
Com um posicionamento muito claro, sem deixar de mencionar que os países mais ricos são os maiores poluidores do planeta, reconheceu que o déficit ambiental é um problema planetário, já que mesmo em regiões mais pobres, como na África, também é preciso, em aliança com outras nações, implementar medidas de enfrentamento ao desastre ecológico. Aliás, em resposta ao questionamento de uma das participantes, também reconheceu que é necessário combater a desigualdade, mas que a resposta à crise ecológica vai além, já que deve mudar as bases socioeconômicas em que a sociedades se sustentam, daí a necessidade de avançar em propostas como o decrescimento.
Focado nas consequências da emergência climática e ambiental, a partir dos diversos gráficos que apresentou, elencou uma série de problemas que já estão presentes no planeta e que poderão se intensificar: perda de biodiversidade e ecocídio, inseticídio, ondas letais de calor, incêndios e queimadas, furacões e inundações, degelo do Ártico, Antártida, Groenlândia e glaciares, elevação do nível do mar e naufrágio dos deltas dos rios, desmatamento e desertificação, erosão dos solos, acidificação dos oceanos, crise hídrica, insegurança alimentar e pandemias, entre outros.
Por fim, José Eustáquio Diniz Alves se mostrou muito preocupado com as limitações no avanço da agenda ambiental no mundo, principalmente com a emergência de lideranças negacionistas como Trump e Bolsonaro. Mas também não deixou de apontar que a questão fica ainda mais complicada quando se observa que mesmo em governos alinhados à esquerda, como, por exemplo, já tivemos no Brasil e na América Latina, a agenda ambiental ficou em segundo plano em comparação às prioridades de Governo, sempre orientadas ao crescimento econômico, com a contumaz voracidade em extrair recursos naturais.
Entre as alternativas que apresentou para evitar o colapso sistêmico global, destacou:
• Reduzir drasticamente o consumo de combustíveis fósseis e fazer a transição energética para fontes renováveis e a transição na indústria automobilística para carros elétricos e compartilhados;
• Investir no transporte coletivo;
• Decrescer os gastos militares e reduzir a produção e uso de instrumentos de guerra;
• Decrescer a produção e o consumo de fertilizantes químicos e agrotóxicos e aumentar os investimentos na agricultura orgânica, na permacultura, etc;
• Decrescer as áreas de pastagem e a produção e o consumo de proteína animal, promovendo a transição para uma dieta vegetariana ou vegana;
• Aumentar as áreas de florestas, de vegetação nativa e a biodiversidade;
• Decrescer as desigualdades, o consumo conspícuo, os bens de luxo, etc;
• Garantir os direitos sexuais e reprodutivos e taxas de fecundidade abaixo do nível de reposição;
• Garantir o decrescimento demoeconômico (reduzindo a Pegada Ecológica), com qualidade de vida humana e ambiental.
Abaixo, é possível acompanhar toda a exposição de José Eustáquio Diniz Alves, com a riqueza de todos os dados apresentados e o chamado a uma tomada de posição de todos, enquanto ainda há tempo, embora, conforme reconheceu, “a coisa é complicada”.
Eis a íntegra da exposição e debate.
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