carta maior
http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=21602&boletim_id=1527&componente_id=26027
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Meio Ambiente| 11/02/2013 | Copyleft
Capital financeiro e mudança climática
Falta hoje um regime regulatório internacional que permita pensar que a economia mundial poderá reduzir sua pegada de carbono na atmosfera na velocidade exigida. O Protocolo de Kioto é uma ficção. E no setor financeiro é onde estão concentradas forças que se oporão fortemente a um acordo que evite o perigo da mudança climática catastrófica. (Na foto, a nevasca que acaba de atingir os EUA, apenas três meses após a tormenta tropical Sandy)
Alejandro Nadal – SinPermiso
As forças do capital financeiro dificultarão muito o enfrentamento das mudanças climáticas. Alguns dizem que a estrutura do setor financeiro não facilitará a transição para uma economia de baixo nível de carbono. O problema é mais grave: o sistema financeiro é um potente obstáculo para prevenir uma catástrofe derivada do aquecimento global.
Para avaliar a dimensão do perigo, é importante recordar alguns dados. Na atualidade, a concentração de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera alcança as 394 partes por milhão (ppm). O CO2 é o gás de efeito estufa mais comum (não é o único, nem o mais potente). Os modelos mais desenvolvidos sobre mudança climática indicam que só abaixo das 450 ppm de CO2 se tem uma probabilidade de manter o aumento de temperatura dentro da classe dos graus centígrados. Os cientistas consideram que esse patamar não deve ser rebaixado caso se queira evitar uma mudança climática catastrófica.
Estudos científicos consideram que para aumentar significativamente a probabilidade de permanecer abaixo deste patamar a economia mundial deveria limitar suas emissões para o período 2000-2050 a 886 gigatoneladas de dióxido de carbono (GtCO2). Na primeira década do século se emitiram 321 GtCO2, de modo que só nos resta um volume disponível de 565 gigatoneladas para o período 2010-2050.
Dados da organização Carbontracker Initiative revelam que se se extraíssem e queimassem as reservas mundiais conhecidas de combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás) teríamos emissões superiores as 2.795 GtCO2. Ou seja, essas reservas contém cinco vezes mais carbono do que o teto acima mencionado de 565 GtCO2. Extrair e usar essas reservas poderia levar à concentração de CO2 na atmosfera para as 700 ppm, o que mudaria o planeta tal como o conhecemos.
Agora, as reservas de combustíveis fósseis das 200 empresas mais importantes de carvão, petróleo e gás no mundo (empresas cotizadas em bolsas de valores) tem reservas com um potencial de carbono de 745 GtCO2. Isso quer dizer que se estas empresas extraírem e queimarem suas reservas estaremos rebaixando para 180 GtCO2 o volume que nos resta disponível para o período 2010-2050 (as 565 GtCO2 acima mencionadas). O problema é ainda mais sério porque estas cifras não incluem as empresas estatais e tampouco levam em conta as gigantescas reservas de gás natural que existem no xisto nos Estados Unidos e em vários outros países.
O problema é que as reservas nas mãos destas companhias já estão anotadas em seus balanços com um enorme valor monetário. Uma avaliação destas empresas admite que essas reservas serão efetivamente realizadas, o que significa que serão extraídas e utilizadas. Do ponto de vista contábil, ninguém está preocupado se a utilização dessas reservas é suficiente para ultrapassar o perigoso patamar dos graus centígrados. A mudança climática não é um conceito contábil.
Para dizê-lo de outro modo, se existisse uma autoridade capaz de aplicar a restrição das 565 GTCO2 para os próximos quarenta anos, estas empresas somente poderiam queimar umas 150 GtCO2. O restante, carbono não injetado na atmosfera, seria de ativos sem valor e se traduziria em perdas colossais para os investidores que comprometeram recursos nessas empresas.
Essas 200 empresas do mundo da energia fóssil têm um valor em bolsa equivalente a 7,4 trilhões de dólares. Os países com maior potencial de gases de efeito estufa nas reservas de empresas que operam em bolsas são Rússia, Estados Unidos e Reino Unido. E nas bolsas de valores de Londres, São Paulo, Moscou, Toronto e do mercado australiano até 30% da capitalização de mercado está vinculada a combustíveis fósseis.
Estamos na presença de um conflito de dimensões históricas: de um lado está a comunidade científica advertindo para não se queimar essas reservas de combustíveis fósseis e do outro estão as empresas e investidores que tem interesse em realizar seus ativos (extrair e usar essas reservas). Quem prevalecerá? Nos últimos 30 anos, o setor financeiro do mundo foi capaz de dominar a política macroeconômica. Com efeito, as prioridades da política monetária e fiscal do mundo inteiro respondem hoje (inclusive em meio à crise) às necessidades do capital financeiro. Por que seria diferente no que diz respeito às políticas sobre mudanças climáticas?
Hoje carecemos de um regime regulatório internacional que permita pensar que a economia mundial poderá reduzir sua pegada de carbono na atmosfera na velocidade exigida. O Protocolo de Kioto é uma ficção e a única coisa que resta é um “compromisso” para se chegar a um acordo em 2015 que deverá entrar em vigor em 2020. No setor financeiro estão concentradas forças que se oporão com tudo a um acordo que evite o perigo da mudança climática catastrófica.
Tradução: Katarina Peixoto
Para avaliar a dimensão do perigo, é importante recordar alguns dados. Na atualidade, a concentração de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera alcança as 394 partes por milhão (ppm). O CO2 é o gás de efeito estufa mais comum (não é o único, nem o mais potente). Os modelos mais desenvolvidos sobre mudança climática indicam que só abaixo das 450 ppm de CO2 se tem uma probabilidade de manter o aumento de temperatura dentro da classe dos graus centígrados. Os cientistas consideram que esse patamar não deve ser rebaixado caso se queira evitar uma mudança climática catastrófica.
Estudos científicos consideram que para aumentar significativamente a probabilidade de permanecer abaixo deste patamar a economia mundial deveria limitar suas emissões para o período 2000-2050 a 886 gigatoneladas de dióxido de carbono (GtCO2). Na primeira década do século se emitiram 321 GtCO2, de modo que só nos resta um volume disponível de 565 gigatoneladas para o período 2010-2050.
Dados da organização Carbontracker Initiative revelam que se se extraíssem e queimassem as reservas mundiais conhecidas de combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás) teríamos emissões superiores as 2.795 GtCO2. Ou seja, essas reservas contém cinco vezes mais carbono do que o teto acima mencionado de 565 GtCO2. Extrair e usar essas reservas poderia levar à concentração de CO2 na atmosfera para as 700 ppm, o que mudaria o planeta tal como o conhecemos.
Agora, as reservas de combustíveis fósseis das 200 empresas mais importantes de carvão, petróleo e gás no mundo (empresas cotizadas em bolsas de valores) tem reservas com um potencial de carbono de 745 GtCO2. Isso quer dizer que se estas empresas extraírem e queimarem suas reservas estaremos rebaixando para 180 GtCO2 o volume que nos resta disponível para o período 2010-2050 (as 565 GtCO2 acima mencionadas). O problema é ainda mais sério porque estas cifras não incluem as empresas estatais e tampouco levam em conta as gigantescas reservas de gás natural que existem no xisto nos Estados Unidos e em vários outros países.
O problema é que as reservas nas mãos destas companhias já estão anotadas em seus balanços com um enorme valor monetário. Uma avaliação destas empresas admite que essas reservas serão efetivamente realizadas, o que significa que serão extraídas e utilizadas. Do ponto de vista contábil, ninguém está preocupado se a utilização dessas reservas é suficiente para ultrapassar o perigoso patamar dos graus centígrados. A mudança climática não é um conceito contábil.
Para dizê-lo de outro modo, se existisse uma autoridade capaz de aplicar a restrição das 565 GTCO2 para os próximos quarenta anos, estas empresas somente poderiam queimar umas 150 GtCO2. O restante, carbono não injetado na atmosfera, seria de ativos sem valor e se traduziria em perdas colossais para os investidores que comprometeram recursos nessas empresas.
Essas 200 empresas do mundo da energia fóssil têm um valor em bolsa equivalente a 7,4 trilhões de dólares. Os países com maior potencial de gases de efeito estufa nas reservas de empresas que operam em bolsas são Rússia, Estados Unidos e Reino Unido. E nas bolsas de valores de Londres, São Paulo, Moscou, Toronto e do mercado australiano até 30% da capitalização de mercado está vinculada a combustíveis fósseis.
Estamos na presença de um conflito de dimensões históricas: de um lado está a comunidade científica advertindo para não se queimar essas reservas de combustíveis fósseis e do outro estão as empresas e investidores que tem interesse em realizar seus ativos (extrair e usar essas reservas). Quem prevalecerá? Nos últimos 30 anos, o setor financeiro do mundo foi capaz de dominar a política macroeconômica. Com efeito, as prioridades da política monetária e fiscal do mundo inteiro respondem hoje (inclusive em meio à crise) às necessidades do capital financeiro. Por que seria diferente no que diz respeito às políticas sobre mudanças climáticas?
Hoje carecemos de um regime regulatório internacional que permita pensar que a economia mundial poderá reduzir sua pegada de carbono na atmosfera na velocidade exigida. O Protocolo de Kioto é uma ficção e a única coisa que resta é um “compromisso” para se chegar a um acordo em 2015 que deverá entrar em vigor em 2020. No setor financeiro estão concentradas forças que se oporão com tudo a um acordo que evite o perigo da mudança climática catastrófica.
Tradução: Katarina Peixoto
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