carta maior
http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Meio-Ambiente/A-marcha-da-loucura/3/30050
Najar Tubino
Porto Alegre - O sintoma das mudanças climáticas, ao contrário do que muitos imaginam, tem atingido muito mais a humanidade e sua população global do que os ecossistemas naturais. Uma pesquisa da Organização Mundial de Saúde mostra que 700 milhões de pessoas sofre de algum tipo de transtorno mental. É a segunda causa de invalidez, sendo que a depressão fica atrás apenas das dores nas costas. Segundo a OMS, a depressão deve ser tratada como uma prioridade de saúde pública global. Na China, 100 milhões de pessoas sofrem de doenças mentais, segundo a revista estatal Outlook Weekly, sendo 16 milhões de casos graves. O artigo foi publicado, logo após o escândalo dos suicídios na Foxconn. A empresa distribui comunicados que os mortos sofriam de doença mental.
No Brasil, São Paulo é a cidade com o índice mais alto de transtornos mentais, segundo o projeto São Paulo Megacity, um estudo realizado pelo Instituto de Psiquiatria, do Hospital de Clínicas com 5.037 residentes, dos 39 municípios da Grande São Paulo, em 2012. Na verdade o estudo “São Paulo Megacity Mental Health Surve” apontou que a região metropolitana e a capital paulista possuem os maiores índices de transtornos mentais do mundo – 29,6%. Os problemas mais comuns são ansiedade, mudanças comportamentais e abuso de substâncias químicas. Depois de SP, os Estados Unidos aparecem em segundo lugar no mesmo estudo da OMS, apenas com um detalhe: não citaram o nome da cidade estadunidense, onde a pesquisa foi realizada. O índice dos cidadãos da clandestina cidade é de 25%.
São Paulo é a campeã mundial de transtornos mentais
São Paulo também coleciona outra marca: a cidade com maior incidência de casos graves de perturbações mentais. A cidade estadunidense o índice é de 5,7%. As causas citadas que transformaram a maior cidade da América Latina e sua região metropolitana numa central de pirados é a alta urbanização associada com privações sociais, que atinge em primeiro lugar migrantes homens e mulheres que residem em regiões de alta vulnerabilidade social. A pesquisa da OMS no Brasil foi financiada pela FAPESP – Fundação de Amparo a Pesquisa de SP -, coordenação da professora Laura Helena Andrade, do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP e da professora Maria Carmen Viana, do Departamento de Medicina Social da Universidade Federal do Espírito Santo.
E mais: outro estudo da USP feito pelo médico do trabalho João Silvestre da Silva Júnior, da Faculdade de Saúde Pública da USP, aponta que os transtornos mentais são a terceira causa de longos afastamentos do trabalho por doença e levaram ao pagamento de mais de R$ 211 milhões de novos benefícios previdenciários em 2011. Dinheiro pago pelo INSS. As causas:
“- O ambiente de trabalho com pouco apoio social, excessivas demandas e baixo controle sobre tarefas, recompensas inadequadas comparadas ao esforço do trabalhador e o comprometimento individual excessivo são fatores que aumentam a chance de ocorrência de afastamento. A pesquisa recomenda uma melhor investigação sobre as condições psicossociais no ambiente de trabalho, para implantação de ações de prevenção, além de maior fiscalização das empresas por parte dos órgãos públicos.”
A depressão atingirá 350 milhões
Em 2011, o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) contabilizou um número acima de 211 mil pessoas que foram afastadas do trabalho devido ao adoecimento mental por prazo superior a 15 dias e passaram a receber auxílio doença.
“- Como o valor supera os R$200 milhões reforça a necessidade econômica de medidas de prevenção para evitar o adoecimento”, aponta a pesquisa do médico João Silvestre.
O estudo da OMS também indica que no período 2013-2020, 350 milhões de pessoas sofrerão de depressão e 90 milhões terão alguma desordem pelo abuso de substâncias químicas. É preciso ressaltar que DUAS em cada DEZ pessoas no mundo tem algum problema psiquiátrico. Nos Estados Unidos, 11% da população com mais de 12 anos já toma remédios antidepressivos. Em 2012, a OMS registrou 781.927 mil suicídios no mundo, que é a 16ª causa da mortalidade global. Com um detalhe: nos Estados Unidos e na Rússia é a 10ª causa. Na Coreia do Sul é a sétima. No Brasil a 25ª.
A loucura fascina o homem
O psiquiatra francês Michel Foucault é o autor do livro “A história da loucura na Idade Clássica”. Diz ele:
“- O conceito de sanidade e loucura são construções sociais que não refletem padrões quantificáveis de comportamento humano e que antes são apenas indicativos de poder dos ‘saudáveis’ sobre o ‘demente’.”
No histórico da civilização ocidental os loucos assumiram o lugar dos leprosos. A partir da Alta Idade Média até o final das Cruzadas, anota Michel Foucault, os leprosários tinham se multiplicado por toda a superfície da Europa. Em 1266, época em que Luís VIII estabelece para a França o regulamento dos leprosários mais de dois mil deles encontravam-se recenseados. Na Diocese de Paris existiam 43. No século XII, a Inglaterra e a Escócia tinham aberto 220 leprosários. Dois a três séculos depois os leprosários são ocupados por pobres, vagabundos, presidiários e ‘cabeças alienadas’.
“- Em todos os lados a loucura fascina o homem. As imagens fantásticas que ela faz surgir não são aparências fugidias, que logo desaparecem da superfície das coisas...por um estranho paradoxo, aquilo que nasce do mais singular delírio já estava oculto, como um segredo, como uma inacessível verdade, nas entranhas da terra”, outra citação do livro.
Nevasca no verão
O privilégio da loucura no século XIII é que ela reina sobre tudo que há de mal no homem. Mas reina também, indiretamente, sobre todo o bem que ele possa fazer.
Sobre a ambição que faz os sábios políticos, sobre a avareza que faz crescer a riqueza, sobre a indiscreta curiosidade que anima os filósofos e cientistas, pergunta Foucault.
“- Por certo a loucura atrai, mas não fascina. Ela governa tudo o que há de fácil, de alegre, de ligeiro no mundo. É ela que faz os homens ‘se agitarem e gozarem’, assim como os deuses; foi ela quem originou o gênio, a juventude, Baco, sileno, e esse gentil guardião dos jardins”.
Enfim, a loucura só existe em cada homem, porque é o homem que a constitui no apego que ele demonstra por si mesmo e através das ilusões com que se alimenta.
Voltemos à realidade: sábado, dia 19 de janeiro de 2013, a apresentadora do Jornal Nacional registra uma nota da “loucura do tempo”. Uma nevasca atingiu o Peru, comprometendo a alimentação dos animais na Cordilheira dos Andes, por consequência,da população também. O detalhe é que o Peru, assim com o Brasil, está em pleno verão. A estação vai de dezembro a março. Não é uma loucura?
http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Meio-Ambiente/A-marcha-da-loucura/3/30050
A marcha da loucura
O sintoma das mudanças climáticas, ao contrário do que muitos imaginam, tem atingido muito mais a humanidade e sua população global do que os ecossistemas.
Porto Alegre - O sintoma das mudanças climáticas, ao contrário do que muitos imaginam, tem atingido muito mais a humanidade e sua população global do que os ecossistemas naturais. Uma pesquisa da Organização Mundial de Saúde mostra que 700 milhões de pessoas sofre de algum tipo de transtorno mental. É a segunda causa de invalidez, sendo que a depressão fica atrás apenas das dores nas costas. Segundo a OMS, a depressão deve ser tratada como uma prioridade de saúde pública global. Na China, 100 milhões de pessoas sofrem de doenças mentais, segundo a revista estatal Outlook Weekly, sendo 16 milhões de casos graves. O artigo foi publicado, logo após o escândalo dos suicídios na Foxconn. A empresa distribui comunicados que os mortos sofriam de doença mental.
No Brasil, São Paulo é a cidade com o índice mais alto de transtornos mentais, segundo o projeto São Paulo Megacity, um estudo realizado pelo Instituto de Psiquiatria, do Hospital de Clínicas com 5.037 residentes, dos 39 municípios da Grande São Paulo, em 2012. Na verdade o estudo “São Paulo Megacity Mental Health Surve” apontou que a região metropolitana e a capital paulista possuem os maiores índices de transtornos mentais do mundo – 29,6%. Os problemas mais comuns são ansiedade, mudanças comportamentais e abuso de substâncias químicas. Depois de SP, os Estados Unidos aparecem em segundo lugar no mesmo estudo da OMS, apenas com um detalhe: não citaram o nome da cidade estadunidense, onde a pesquisa foi realizada. O índice dos cidadãos da clandestina cidade é de 25%.
São Paulo é a campeã mundial de transtornos mentais
São Paulo também coleciona outra marca: a cidade com maior incidência de casos graves de perturbações mentais. A cidade estadunidense o índice é de 5,7%. As causas citadas que transformaram a maior cidade da América Latina e sua região metropolitana numa central de pirados é a alta urbanização associada com privações sociais, que atinge em primeiro lugar migrantes homens e mulheres que residem em regiões de alta vulnerabilidade social. A pesquisa da OMS no Brasil foi financiada pela FAPESP – Fundação de Amparo a Pesquisa de SP -, coordenação da professora Laura Helena Andrade, do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP e da professora Maria Carmen Viana, do Departamento de Medicina Social da Universidade Federal do Espírito Santo.
E mais: outro estudo da USP feito pelo médico do trabalho João Silvestre da Silva Júnior, da Faculdade de Saúde Pública da USP, aponta que os transtornos mentais são a terceira causa de longos afastamentos do trabalho por doença e levaram ao pagamento de mais de R$ 211 milhões de novos benefícios previdenciários em 2011. Dinheiro pago pelo INSS. As causas:
“- O ambiente de trabalho com pouco apoio social, excessivas demandas e baixo controle sobre tarefas, recompensas inadequadas comparadas ao esforço do trabalhador e o comprometimento individual excessivo são fatores que aumentam a chance de ocorrência de afastamento. A pesquisa recomenda uma melhor investigação sobre as condições psicossociais no ambiente de trabalho, para implantação de ações de prevenção, além de maior fiscalização das empresas por parte dos órgãos públicos.”
A depressão atingirá 350 milhões
Em 2011, o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) contabilizou um número acima de 211 mil pessoas que foram afastadas do trabalho devido ao adoecimento mental por prazo superior a 15 dias e passaram a receber auxílio doença.
“- Como o valor supera os R$200 milhões reforça a necessidade econômica de medidas de prevenção para evitar o adoecimento”, aponta a pesquisa do médico João Silvestre.
O estudo da OMS também indica que no período 2013-2020, 350 milhões de pessoas sofrerão de depressão e 90 milhões terão alguma desordem pelo abuso de substâncias químicas. É preciso ressaltar que DUAS em cada DEZ pessoas no mundo tem algum problema psiquiátrico. Nos Estados Unidos, 11% da população com mais de 12 anos já toma remédios antidepressivos. Em 2012, a OMS registrou 781.927 mil suicídios no mundo, que é a 16ª causa da mortalidade global. Com um detalhe: nos Estados Unidos e na Rússia é a 10ª causa. Na Coreia do Sul é a sétima. No Brasil a 25ª.
A loucura fascina o homem
O psiquiatra francês Michel Foucault é o autor do livro “A história da loucura na Idade Clássica”. Diz ele:
“- O conceito de sanidade e loucura são construções sociais que não refletem padrões quantificáveis de comportamento humano e que antes são apenas indicativos de poder dos ‘saudáveis’ sobre o ‘demente’.”
No histórico da civilização ocidental os loucos assumiram o lugar dos leprosos. A partir da Alta Idade Média até o final das Cruzadas, anota Michel Foucault, os leprosários tinham se multiplicado por toda a superfície da Europa. Em 1266, época em que Luís VIII estabelece para a França o regulamento dos leprosários mais de dois mil deles encontravam-se recenseados. Na Diocese de Paris existiam 43. No século XII, a Inglaterra e a Escócia tinham aberto 220 leprosários. Dois a três séculos depois os leprosários são ocupados por pobres, vagabundos, presidiários e ‘cabeças alienadas’.
“- Em todos os lados a loucura fascina o homem. As imagens fantásticas que ela faz surgir não são aparências fugidias, que logo desaparecem da superfície das coisas...por um estranho paradoxo, aquilo que nasce do mais singular delírio já estava oculto, como um segredo, como uma inacessível verdade, nas entranhas da terra”, outra citação do livro.
Nevasca no verão
O privilégio da loucura no século XIII é que ela reina sobre tudo que há de mal no homem. Mas reina também, indiretamente, sobre todo o bem que ele possa fazer.
Sobre a ambição que faz os sábios políticos, sobre a avareza que faz crescer a riqueza, sobre a indiscreta curiosidade que anima os filósofos e cientistas, pergunta Foucault.
“- Por certo a loucura atrai, mas não fascina. Ela governa tudo o que há de fácil, de alegre, de ligeiro no mundo. É ela que faz os homens ‘se agitarem e gozarem’, assim como os deuses; foi ela quem originou o gênio, a juventude, Baco, sileno, e esse gentil guardião dos jardins”.
Enfim, a loucura só existe em cada homem, porque é o homem que a constitui no apego que ele demonstra por si mesmo e através das ilusões com que se alimenta.
Voltemos à realidade: sábado, dia 19 de janeiro de 2013, a apresentadora do Jornal Nacional registra uma nota da “loucura do tempo”. Uma nevasca atingiu o Peru, comprometendo a alimentação dos animais na Cordilheira dos Andes, por consequência,da população também. O detalhe é que o Peru, assim com o Brasil, está em pleno verão. A estação vai de dezembro a março. Não é uma loucura?
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