CULT
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O devir-negro do mundo
(Arte Andreia Freire)
Alguns meses antes do assassinato de Marielle Franco, foi publicado no Brasil o livro Necropolítica, de Achille Mbembe. O autor anotou em seu blog essa coincidência, como se o livro chegasse aqui na hora mais cruel, mas também mais necessária. Não temos dúvida de que, juntamente com Crítica da razão negra, a obra do maior pensador africano da atualidade chega a nosso país num momento crucial, em que o assassinato de negras e negros ou seus representantes na periferia das cidades brasileiras deixa de ser uma prática corrente, como o era até há pouco, para ser duplicado por um discurso que o valida e legitima, orgulhosamente, através de um político fascista que tem chances reais de se tornar o próximo presidente da República (no momento em que escrevo estas linhas o resultado das eleições ainda é incerto). Diante da legitimação política do extermínio de negrxs pobres sob a alegação de que bandido bom é bandido morto, supondo-se uma equivalência entre negro/pobre/bandido, a herança escravagista em nossa sociedade, cultura, economia, política, é cada dia mais gritante – e é o que está no fundo da pregação demente de Bolsonaro. Como se perpetuássemos a convicção escravocrata de que um negro perambulando solto ou em áreas e esferas reservadas aos brancos só pode ser um foragido da senzala, a ser caçado ou eliminado.
Nada mais valioso, portanto, do que mergulhar no pensamento de Achille Mbembe e trazer à tona essa camada tão silenciada de nossa história. Com sua erudição estonteante, histórica, literária, religiosa, filosófica, tanto no âmbito africano como europeu ou americano, ele construiu a mais aguda genealogia do racismo da modernidade. E mais: sua perspectiva vira do avesso as abordagens identitárias sobre a questão. Na esteira de Fanon ou de Baldwin, Mbembe reafirma que a liberação das opressões vigentes hoje está diretamente associada ao destino da negritude no planeta. Com mais razão isso vale para o Brasil.
Pois a pergunta que atravessa sua obra é perturbadora. Como é possível que a elaboração de nosso “humanismo ocidental”, em cujas fontes bebemos incessantemente, tenha sido acompanhada pela invenção do Negro como um corpo-mercadoria? De que modo a universalidade humanista pôde forjar na sua contraluz essa figura opaca, mas também perigosa, sexualmente ameaçadora, portadora da noite e da escuridão a que chamaram de Negro? Sombra das Luzes, do Progresso e da Liberdade, o Negro permaneceu como o emblema da anticivilização. Mas por que tal demonização foi necessária? Como foi isso compatível com o ideário da Revolução Francesa? De que modo esse extermínio concreto e simbólico permaneceu ao longo dos séculos como um não dito que ainda hoje determina quem deve viver e quem deve morrer em nosso planeta? Sim, é esse o fundo da questão: essa herança de todo viva é que decide, hoje ainda, como se reparte vida e morte, não só no continente africano, nas periferias brasileiras ou americanas, na costa do mediterrâneo europeu, mas por toda parte onde a cor da pele ainda diz o não ser.
Necropolítica
Que o biopoder se declina como poder de morte, nós o sabemos desde Foucault de A vontade de saber. Ali o filósofo contrapõe um regime de soberania, vigente até o século 18, em que o soberano gozava o direito de fazer morrer caso atacado em sua hegemonia ou honra, ao novo mecanismo que se instala, a que Foucault chama de biopoder, que se incumbe de cuidar da população, otimizar suas condições de vida, proteger seus corpos ou sua “raça”. Ao invés de fazer morrer e deixar viver, como na soberania, o biopoder faz viver e deixa morrer.
Mas Foucault mesmo embaralha as cartas, ao mostrar a que ponto eles podem sobrepor-se e coexistir. Assim, em casos extremos como o nazismo, fazer viver (os arianos) se conjuga com fazer morrer (outras “raças”). Foi num contexto de defesa da vida (de uns) que se desencadearam as guerras mais virulentas, os maiores massacres, as carnificinas mais devastadoras (contra “os outros”). É em nome da sobrevivência biológica da própria população que se exerce a matança das demais. Assim, no nazismo, biopolítica e tanatopolítica constituem verso e reverso da mesma moeda. Foi em defesa da vida de um povo específico que se limpou a terra daqueles que supostamente a maculavam com sua mera existência, mera vida, vida nua. “Tem-se, pois, na sociedade nazista, esta coisa, apesar de tudo, extraordinária: é uma sociedade que generalizou absolutamente o biopoder, mas que generalizou, ao mesmo tempo, o direito soberano de matar. Os dois mecanismos, o clássico, arcaico, que data do Estado do direito de vida e de morte sobre seus cidadãos, e o novo mecanismo organizado em torno da disciplina, da regulamentação, em suma, o novo mecanismo de biopoder, vêm exatamente, a coincidir. De sorte que se pode dizer isto: o Estado nazista tornou-se absolutamente coextensivos o campo de uma vida que ele organiza, protege, garante, cultiva biologicamente, e, ao mesmo tempo, o direito soberano de matar quem quer que seja – não só os outros, mas os seus próprios. […] Temos um Estado absolutamente racista, um Estado absolutamente assassino e um Estado absolutamente suicida.”
Mais e mais assistimos, desde então, a essa conjugação que não parece ser apanágio do nazismo, porquanto caracteriza também as democracias ocidentais ou regimes totalitários de hoje, tendo marcado até mesmo os países do socialismo real, pois também nele vigorou a ideia de que “a sociedade ou o Estado, ou o que deve substituir o Estado, tem essencialmente a função de incumbir-se da vida, de organizá-la, de multiplicá-la, de compensar suas eventualidades, de percorrer e delimitar suas chances e possibilidades biológicas”. O exemplo dado por Foucault não é um racismo étnico, porém biológico, evolucionista, que encarcera doentes mentais e adversários políticos. Se quiséssemos ampliar o exemplo de Foucault e atualizá-lo, mencionaríamos a bárbara repressão empreendida pelo Estado chinês contra a minoria muçulmana uighur na província de Xinjiang, em que dez por cento da população da região, isto é, um milhão de pessoas, está em “campos de reeducação” neste preciso momento, sem que nenhuma nota apareça na imprensa chinesa, e muito pouco na internacional, a respeito do fato.
Em todo caso, há algo que é comum a todos esses casos, e cuja presença Foucault insiste em frisar na gênese do biopoder, a saber, o racismo. “Com efeito, o que é o racismo? É, primeiro, o meio de introduzir afinal, nesse domínio da vida de que o poder se incumbiu, um corte: o corte entre o que deve viver e o que deve morrer. […] Essa é a primeira função do racismo: fragmentar, fazer cesuras no interior desse contínuo biológico a que se dirige o biopoder. […] A função assassina do Estado só pode ser assegurada, desde que o Estado funcione no modo do biopoder, pelo racismo”.
Difícil discordar. Mas, curiosamente, na genealogia construída por Foucault a referência à escravidão é relativamente tímida. Ele nota: “O racismo vai se desenvolver primo com a colonização, ou seja, com o genocídio colonizador. Não à toa essa menção quase episódica à história da escravidão, ao trato atlântico, à colonização, à racialização do domínio europeu pode causar certa estranheza.
Mesmo assim, em seu ensaio Necropolítica, o autor retoma a definição de biopoder exposta por Foucault em É preciso defender a sociedade, e o coloca em relação com a ideia de estado de exceção, tal como exposta por Carl Schmitt e retomada por Giorgio Agamben. Mas, em vez de focar no nazismo, Mbembe recua para a plantation e nela vê o primeiro laboratório biopolítico do planeta, com sua racionalidade própria – “figura emblemática e paradoxal do estado de exceção”. É ali que surge, segundo ele, o terror moderno. E pergunta, contrastando com Agamben, se o paradigma biopolítico da modernidade não seria a plantation, ao invés do campo de extermínio. Muito antes da deportação de judeus, ciganos, homossexuais e comunistas para os campos de concentração nazista, o negro capturado, exportado da África e escravizado é privado de qualquer estatuto jurídico. Ele é vítima de uma tripla perda, diz Mbembe: “perda de um lar, perda de direitos sobre seu corpo e perda de estatuto político. Essa tripla perda equivale a uma dominação absoluta, uma alienação de nascença e uma morte social”. É nesse contexto que começam a se experimentar, de maneira racional, procedimentos como esterilização forçada, interdição de casamentos mistos, até o extermínio puro e simples. Portanto, racionalidade e terror já se conjugam. É, aliás, o que Hannah Arendt entende, em Origens do totalitarismo, ao sustentar que na Segunda Guerra Mundial métodos anteriormente reservados apenas aos “selvagens” passaram a ser aplicados também aos povos ditos “civilizados” da Europa. Não terá sido esse o elemento mais escandaloso? Que o que era aceitável para os negros, subitamente, foi aplicado também aos brancos? Num outro contexto, Aimé Cesaire escreveu: “Sim, valeria a pena estudar, clinicamente, no detalhe, as trajetórias de Hitler e do hitlerismo e revelar ao burguês do século 20, muito distinto, muito humanista, muito cristão, que ele carrega um Hitler que se ignora, que Hitler mora nele, que Hitler é seu demônio, que se ele o vitupera é por falta de lógica, e que, no fundo, o que ele não perdoa a Hitler não é o crime em si, o crime contra o homem, não é a humilhação do homem em si, é o crime contra o homem branco, e de ter aplicado à Europa procedimentos colonialistas que até agora eram exclusividade dos árabes da Argélia, dos collies da Índia e dos negros da África. E é a grande acusação que eu lanço ao pseudo-humanismo: de ter por muito tempo apequenado os direitos do homem, de ter tido, de ainda ter dele uma concepção estreita e parcial, em suma, sordidamente racista.” Ou mais explicitamente: “No final do capitalismo, desejoso de sobreviver, há Hitler. No final do humanismo formal e da renúncia filosófica, há Hitler”.
Será tão importante determinar “onde” começa o pior? Como diz Mbembe: “No fim, pouco importa que as tecnologias que culminaram no nazismo tenham sua origem na plantation ou na colônia, ou, pelo contrário – a tese foucaultiana –, que nazismo e stalinismo não tenham feito mais do que ampliar uma série de mecanismos que já existiam nas formações sociais e políticas da Europa ocidental (subjugação do corpo, regulamentações médicas, darwinismo social, eugenia, teorias legais sobre hereditariedade, degeneração e raça). Um traço persiste evidente: no pensamento filosófico moderno assim como na prática e no imaginário político europeu, a colônia representa o lugar em que a soberania consiste fundamentalmente no exercício de um poder à margem da lei (ab legibus solutus) e no qual a ‘paz’ tende a assumir o rosto de uma ‘guerra sem fim’.”
Necropolítica, pois, é a política de morte. Em Mbembe, ela é racializada, mas extrapola essa dimensão, na medida em que a negritude, por exemplo, não é apenas uma condição subalterna reservada aos negros, já que é o lote de sofrimento que pouco a pouco se estende para além dos negros – é o devir-negro do mundo, que abarca desempregados, descartáveis, favelados, imigrantes. Que a política seja declinada como necropolítica, como política de extermínio, diz algo da sobrevivência da matriz colonial no contexto contemporâneo.
Se quiséssemos buscar uma explicação para o relativo silêncio de Foucault a respeito, seria fácil demais acusá-lo de eurocentrismo. Mais prudente, talvez, seja sustentar que seu foco, no momento da teorização do biopoder, é analisar como essa tecnologia de poder nova que se alastrou pelo planeta usou o racismo no interior de sua lógica própria, em vez de apenas o ter herdado e o ter reiterado. Eis como Foucault o explicita: “A especificidade do racismo moderno, o que faz sua especificidade, não está ligado a mentalidades, a ideologias, a mentiras do poder. Está ligado à técnica do poder, à tecnologia do poder. Está ligado a isto que nos coloca, longe da guerra das raças e dessa inteligibilidade da história, num mecanismo que permite ao biopoder exercer-se. Portanto, o racismo é ligado ao funcionamento de um Estado que é obrigado a utilizar a raça, a eliminação das raças e a purificação da raça para exercer seu poder soberano.” Que o racismo serve ao biopoder, e não o biopoder ao racismo, eis um problema que mereceria um aprofundamento, e extrapola o espaço aqui disponível.
O avesso do humanismo
Mas voltemos a Mbembe, com Crítica da razão negra, seu livro mais importante, e que já nasceu clássico. Ali o autor sustenta que a constituição do pensamento europeu como um humanismo ou um discurso sobre a humanidade é indissociável do surgimento da figura do Negro como personagem racial. A partir do século 18, lembra Mbembe, essa conjunção denegada entre humanismo e racismo teria sido o subsolo do projeto moderno, figuras gêmeas “do delírio que terá produzido a modernidade”. Escravos sempre houve ao longo da história da humanidade, mas eram fruto em geral da vitória numa guerra e, portanto, ex-adversários. Nunca se tornariam escravos em virtude da cor da pele. Apenas com o trato atlântico de homens e mulheres originários da África, a partir do século 16, os negros se transformaram em homens-objeto, homens-mercadoria e homens-moeda.
A Europa, que se considerava o centro do mundo civilizado, se contrapunha ao Resto, cujo símbolo maior foi a África e o Negro, figura do ser-outro, poderosamente trabalhado pelo vazio, ameaça, destruição – era a noite do mundo, conforme a expressão de Aimé Césaire. Mas é quando o princípio da raça é submetido ao capital que tudo isso ganha fôlego histórico. Pois o Atlântico se tornou o epicentro de uma nova “concatenação dos mundos, o lugar de onde emerge uma nova consciência planetária”. Depois de 1492 ele se torna o feixe que reúne a África, as Américas, o Caribe e a Europa, e essa economia que exige capitais colossais inclui toda uma circulação inédita, um tráfico entre religiões, línguas, tecnologias. A transnacionalização da condição negra é um momento constitutivo da modernidade. E o conceito de raça serve para diagnosticar as populações longínquas, sua “degradação”, e um déficit ontológico – são “menos” ser. Ou misto de monstros e fósseis. Em suma, produzir o Negro é produzir uma submissão e um corpo de extração.
Mas o Negro é também o nome de uma injúria, de uma calúnia, do perigo, do revoltoso a ser domado incessantemente – no contexto da plantation isso tudo é condição de produção, é o que vai permitir uma das formas mais eficazes de acumulação. A racialização foi um elemento central na acumulação colonial que deu origem ao capitalismo. Capitalismo, colonialismo, racismo são peças de uma mesma engrenagem da qual somos herdeiros diretos – seja dos colonos ou de suas vítimas.
Por essa e outras razões, Mbembe retoma a questão de como se opera a passagem do estatuto de escravo em direção a uma nova comunidade, a dos homens livres, sendo que a condição que lhes é comum é a de serem estrangeiros a si mesmos, e o desafio consiste em conjurar a estrutura de assujeitamento que eles carregam. A ideia de que a raça seja um excedente, uma vida que pode ser despendida sem reserva, embora a ciência postule a extraordinária homogeneidade genética dos humanos, continua a produzir efeitos de mutilação em nome da qual se operam cesuras. A utopia de Mbembe, de uma extrema beleza, consiste em imaginar que a cultura branca, que se vê assediada pela ameaça de uma “revolta dos escravos”, seja capaz não apenas de “liberá-los” de fato, não apenas formalmente, mas sobretudo seja capaz de refundar seu próprio sistema da propriedade, do trabalho, dos mecanismos de redistribuição, e com isso modificar os fundamentos da própria reprodução da vida – removendo os fantasmas que desde o início acompanhavam a construção da condição negra.
Talvez seja este, ao menos em parte, o motivo pelo qual “a Revolução Haitiana tem sido tão negligenciada na história moderna… [pois foi] a primeira revolução moderna contra a escravidão, e por isto poderia ser considerada a primeira revolução propriamente moderna”, como diz Antonio Negri. Que isso tenha passado desapercebido aos olhos de Hegel, o filósofo que fez da dialética entre o senhor/escravo um dos eixos de seu pensamento sobre a liberdade só mostra a que ponto um episódio concreto, radical, porém ocorrido em terras longínquas, e de que Hegel teve notícia pelo jornal, foi insuficiente para deslocá-lo de seu atávico eurocentrismo. É o calcanhar de Aquiles da historiografia europeia, haja vista o lugar secundário que ocupa a “revolução negra” na história das revoluções, esta que teve por objetivo destruir de vez a “plantation escravagista”. Talvez diante da crescente provincialização da Europa, estejamos assistindo a um dos efeitos de um deslocamento de placas tectônicas cujos resultados ainda mal se deixam perceber.
De fato, Achille Mbembe, através da condição da negritude, e de um horizonte de redenção histórica, pensa hoje no “em-comum”, contra a utopia racista de uma “comunidade sem estrangeiros”. Assim como se pode pensar uma vontade de poder, se deve postular uma vontade de comunidade, mas uma comunidade descolonizada. E não mais concebida em termos étnicos.
Quão longe está tudo isso das polarizações identitárias de hoje, e que repousam às vezes em abissais assimetrias sociais! Sobretudo num contexto de tamanha privatização do mundo, com o respectivo esquadrinhamento hierárquico sob a égide do neoliberalismo, nessa junção entre economia financeira, complexo militar e tecnologias digitais, quando “já não há trabalhadores enquanto tal”, mas “apenas nômades do trabalho”, espécie de “animal” pronto para vestir todo tipo de roupagem que o mercado solicita, transformável no que dele for pedido, “sujeito neuro-econômico absorvido pela dupla preocupação exclusiva de sua animalidade (a reprodução biológica de sua vida) e de sua coisidade (o desfrute dos bens desse mundo)”, este homem-coisa, homem-máquina, homem-código e homem-fluxo. Ou seja, tudo aquilo que antes era exclusivo do negro no primeiro capitalismo passou a ser senão a norma, ao menos “o lote de todas as humanidades subalternas”. Trata-se de uma universalização tendencial da condição negra, aliada ao surgimento de práticas imperiais inéditas, que utilizam tanto lógicas escravagistas de captura e predação quanto lógicas coloniais de ocupação e extração, para não falar de guerras civis ou razzias das épocas anteriores. Donde essa ideia muito forte: “Pela primeira vez na história humana, o nome negro não remete mais somente à condição imposta às pessoas de origem africana na época do primeiro capitalismo. É essa fungibilidade nova, essa solubilidade, sua institucionalização enquanto nova norma de existência e sua generalização ao conjunto do planeta que nós designamos de devir-negro do mundo.”
Ora, num momento em que se alastra um racismo sem raça, reinventando-se discriminações, hierarquias, assimetrias, quando a religião ou a cultura vão tomando o lugar da biologia como fundamento da discriminação, o que fazer com o Negro? Esquecê-lo? Ou ao contrário, preservar sua “potência do falso”, seu caráter luminoso, fluido e cristalino, esse “estranho sujeito escorregadio, serial e plástico, constantemente mascarado, firmemente instalado dos dois lados do espelho, ao longo de uma fronteira que ele não cessa de seguir”? As análises dessa dimensão subjetiva, com uso abundante de material literário, vetores religiosos e perspectiva psicanalítica, são um dos pontos mais tocantes deste livro. E se o Negro devesse sobreviver, e por uma dessas reviravoltas da história, os subalternos da humanidade se tornassem “negros” e, a partir daí, se desencadeasse uma reviravolta que extrapolasse a própria condição dos negros?
Peter Pál Pelbart é doutor em Filosofia pela USP, professor do departamento de Filosofia da PUC-SP e editor de Achille Mbembe no Brasil
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