Exclusivo: Pescadores da Venezuela contam como renderam os mercenários dos EUA
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Por Fania Rodrigues, de Caracas | Venezuela
A imagem de mercenários norte-americanos amarrados com cordas de pescadores artesanais, rendidos no chão, em comunidade costeira da Venezuela, foi parar nas páginas dos principais jornais do mundo, na semana passada. No fundo da mesma imagem aparece um muro da Casa do Pescador Socialista, uma associação, com a parede pintada com rostos dos heróis revolucionários venezuelanos: Simón Bolívar, Francisco de Miranda, Ezequiel Zamora e Hugo Chávez.
Os pescadores afirmam que a cena não foi planejada, mas sim, resultado do instinto de sobrevivência já que tiveram que deter os homens que queriam atacar seu país. A foto também representa a genuína gentileza venezuelana, pois só foram parar em frente da Casa do Pescador Socialista porque era o único lugar onde havia uma árvore e assim pouparam os invasores de estar sob o escaldante sol caribenho, enquanto chegava o reforço que vinha em helicóptero militar.
Isso aconteceu no último dia 4 de maio, na vila de pescados de Chuao de 3.500 habitantes, na costa do estado de Aragua, no norte do país. Um grupo de aproximadamente 60 mercenários, composto por ex-combatentes do exército dos Estados Unidos e desertores da Força Armada Nacional Bolivariana, tentou invadir a costa venezuelana para colocar em prática um plano que foi chamado por eles de Operação Gedeón. Tinha como objetivo sequestrar ou matar o presidente Nicolás Maduro e a cúpula do seu governo.
Em Chuao, nesse dia, foram presos oito homens. Entre eles os sargentos norte-americanos Airan Berry e Luke Denman, que serviram nas Forças Especiais dos Estados Unidos, conhecidas como Boinas Verdes. Os dois participaram de operações no Iraque, como a tropa de elite do exército mais poderoso do mundo. Chegaram a fazer parte do círculo de segurança do presidente Donald Trump, conforme vídeo e fotos de 2018. Agora, trabalham para a empresa de segurança privada Silvercorp, de propriedade do também ex-militar dos EUA, Jordan Goudreau, que assinou um contrato com o líder opositor venezuelano Juan Guaidó, para executar a Operação Gedeón. O conselho de Guaidó, Juan José Rendón, que igualmente assinou o contrato, pediu demissão na última segunda-feira (11/05).
O que não imaginavam os invasores é que a operação terminaria em uma cena assim, diz o morador de Chuao, Reinaldo Chávez. “Eles não imaginavam a surpresa que aqui os esperavam. Eles podem ser ‘Rambos’ e nós um povo humilde, mas com a verdade sempre vamos vencer”, disse à Telesur.
O pescador Julio Moreno, porta-voz do Conselho de Pescadores de Chuao, relatou como foi a atuação dos pescadores. Nos dias prévios foram alertados pela agência de inteligência venezuelana e montaram uma estratégia de defesa da comunidade. Alguns jovens se espalharam pelas montanhas próximas à costa para observar e identificar possível aproximação de embarcações que não eram da zona.
“Nossos homens, desde a montanha, avistaram a embarcação quando eles estavam cortando o teto do barco, porque eles tiraram o teto e jogaram no mar, para dificultar a identificação. Avisamos as autoridades, rapidamente chegou o helicóptero militar. Armamos um plano de defesa da praia”, relata Julio Moreno.
Na vila havia apenas cinco policiais, portanto a ajuda dos pescadores locais foi fundamental para prender os mercenários. Em mar contavam com a ajuda de um helicóptero militar e um barco da marinha venezuelana, que ajudaram a evitar qualquer tentativa de fuga, mas uma vez em terra firme foram os policiais com escopetas e pistolas, junto com os pescadores, que conseguiram prender e garantir a rendição dos suspeitos até chegar reforço.
“Os militares que estavam no helicóptero fizeram alguns disparos de advertência na água para que apagassem o motor do barco. Uma vez que chegaram à baía ordenamos que descessem da embarcação, os atamos e já quando estavam dominados os entregamos aos policiais e comando da Guarda Nacional Bolivariana que estavam ali presentes”, explica o porta-voz do Conselho de Pescadores de Chuao.
O chefe do posto policial de Chuao, Andrés Jesus, diz que em 19 anos de corporação jamais pensou ver algo assim na pacata vila de pescadores. “A população ficou assustada, nunca vimos nada assim. Mas nossos policiais se sentiram respaldados pelos pescadores e pela população local. Tivemos amarrar os terroristas com linha de pesca de nylon porque era a única coisa que a gente tinha naquele momento, improvisamos. Os próprios pescadores ajudaram imobilizar os terroristas”.
Um dos policiais teve que sair para buscar os militares que chegavam de helicóptero e pousaram longe do centro da vila. Mais uma vez foi à população de pescadores que ajudou a custodiar os invasores. O morador da vila José André Bolívar conta como foi. “Aqui nós produzimos peixe e cacau, mais nada. Não estamos acostumados com violência, por isso nos assustamos e começamos a correr para ajudar os policiais e os agarramos [os mercenários]”.
Segundo o chefe da polícia, a população local estava em alerta há meses. Pois, o comando da Polícia Nacional Bolivariana já havia enviado cartazes com os rostos dos mercenários que poderiam tentar uma invasão a qualquer momento. “Foi por isso que quando os moradores viram os rostos rapidamente reconheceram o filho de Badual”, conta o policial Andres Jesus.
Josnars Adolfo Baduel, preso em Chuao, é conhecido porque já participou de outras tentativas de golpe, mas também por ser filho do general Raúl Isaías Baduel. O oficial chegou a ser ministro da Defesa do ex-presidente Hugo Chávez e que está preso desde 2009 por corrupção.
Chuao organiza defesa comunitária
Chuao que era conhecida por suas belezas naturais e principalmente por suas fazendas de cacau, reconhecido pela indústria do chocolate como um dos cacaus mais sofisticados do mundo. Agora essa pequena vila também é referência de resistência revolucionária.
A vila não tem acesso terrestre, por isso é preciso tomar um barco e viajar cerca de 20 minutos desde Choroni, a cidade mais próxima. Esse paraíso natural teve que se adaptar à nova realidade, diante das ameaças de invasão militar.
A população se organizou para proteger a comunidade, diz Julio Moreno. “Uma vez que tudo isso passou já estamos consciente da dimensão da ação que organizamos nesse dia. Mas, não baixamos a guarda. Duplicamos os esforços para garantir a segurança de Chuao e das outras comunidades que fazem parte do eixo costeiro venezuelano”.
Ele afirma ainda que população foi treinada para ser identificar situações e pessoas suspeitas. “Conformamos um grupo de agente de inteligência popular, com isso conseguimos capturar outro mercenário na comunidade vizinha, em Cepe. A ação que estamos desenvolvendo é com o povo em armas para defender seu país”, ressaltou o pescador.
Esses treinamentos fazem parte da rotina a Milícia Nacional Bolivariana, um corpo de segurança que conforma um exército popular de civis com adestramento militar. Atualmente cerca de 4 milhões de venezuelanos estão alistados nessas brigadas, que faz parte do sistema de segurança oficial da Venezuela. Além da Milícia Bolivariana, estão sendo criados grupos de defesas de pescadores na costa, como esse conformado pelos moradores de Chuao.
Nos dias que seguiram a população de outras comunidades ajudaram na captura de vários grupos de mercenários. Foi assim na vila pescadores de Cepe e comunidade de Junquito, onde camponeses identificaram dois deles e chamaram os militares. Já foram presos mais de 40 suspeitos e oito abatidos em confronto. O país mantém o alerta de segurança máxima, estabelecido no dia 3 de maio, quando foram flagrados os primeiros mercenários no porto de La Guaira, estado Vargas.
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