Tuesday, 27 September 2011

os artigos quentes do br 2/3

fonte: fapesp
http://revistapesquisa.fapesp.br/?art=4504&bd=1&pg=2&lg=


PRODUÇÃO CIENTÍFICA
Os artigos quentes do Brasil
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© NELSON PROVAZI
OS FRUTOS DO GENOMADois artigos da lista são frutos do Programa Genoma FAPESP, iniciativa lançada em 1997 que criou uma rede virtual de 60 laboratórios dedicada a sequenciar o genoma de vários organismos. Um exemplo é um artigo publicado na revista Nature em maio de 2002 que mapeou os genes daXanthomonas citri, causadora do cancro cítrico, e comparou os resultados ao sequenciamento da bactéria Xanthomonas campestri. O estudo foi feito pelo mesmo grupo que sequenciou o primeiro genoma de um patógeno, o da Xylella fastidiosa, causadora da praga do amarelinho, capa da revista Nature em 2000. “O estudo com a Xanthomonas foi a continuação do trabalho com a Xylella, mas foi muito mais complexo, pois envolvia dois genomas e patógenos mais complexos”, diz Fernando Reinach, um dos autores do artigo. Parte dos 65 pesquisadores que assinam o paper saiu da academia e foi trabalhar com pesquisa em instituições privadas, caso da primeira autora, Ana Claudia Rasera da Silva, atualmente na empresa DuPont. O artigo, com 565 citações, superou o da Xylella, que teve 529 e não aparece na lista feita por Zago por haver sido publicado antes de 2001. Outra contribuição do programa ao rol dos artigos altamente citados foi liderada por Sérgio Verjovski-Almeida, professor do Instituto de Química da USP. Publicado em 2003 na Nature Genetics, o artigo mostrou os resultados de um esforço de pesquisa que determinou as sequências de 92% dos 14 mil genes do Schistosoma mansoni, parasita causador da esquistossomose.

Mas o que faz um artigo ser altamente citado? Um denominador comum é a contribuição original do artigo, seja na forma de novos achados ou na interpretação dos dados existentes, como acontece em alguns textos de revisão. Com 547 citações na base ISI, um artigo assinado por Fernando Von Zuben, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e Leandro de Castro, da Universidade Mackenzie, fez uma proposta pioneira na área de Sistemas Imunológicos Artificiais, que se caracteriza pelo interesse em reproduzir princípios e mecanismos do sistema imunológico para resolver problemas de engenharia de computação. O paper foi o primeiro a formalizar computacionalmente o princípio da seleção clonal, que, na medicina, explica como linfócitos selecionam antígenos para destruição. O princípio, diz Von Zuben, foi proposto nos anos 1950 e representou um marco da imunologia. O pesquisador atribui a popularidade do artigo à funcionalidade dos algoritmos propostos e à qualidade do periódico, chamado IEEE Transactions on Evolutionary Computation. “Os algoritmos cumprem bem o papel de importar para o computador habilidades presentes no sistema imunológico, como memória e resposta de adaptação a estímulos”, afirma. Outra contribuição original em ciência da computação foi feita por Paulo Barreto, do Laboratório de Arquitetura e Redes de Computadores (Larc) da Escola Politécnica da USP. Em parceria com pesquisadores das universidades Stanford, nos Estados Unidos, e de Dublin, na Inglaterra, Barreto criou uma aplicação prática para um conceito matemático e apresentou um conjunto de algoritmos voltados para a implementação de sistemas de criptografia. O artigo foi publicado no livro Advances in cryptology – Crypto 2002.
O grupo do biólogo José Alexandre Felizola Diniz Filho, da Universidade Federal de Goiás, desenvolveu técnicas para evitar erros estatísticos que acontecem quando se faz a relação entre dados ecológicos, como a riqueza da biodiversidade, e localizações geográficas. “Foi interessante, pois aconteceu o inverso do que ocorre normalmente, em termos de transferência de ciência e tecnologia”, diz Diniz Filho. “Começamos a aplicar as técnicas em dados macroecológicos e repassamos isso para grupos de pesquisa no resto do mundo.” Um professor da Universidade da Califórnia, Brad Hawkins, veio ao Brasil aprender as técnicas em 2002 e estimulou o grupo a escrever o paper, que já recebeu mais de 200 citações. O conhecimento resultou num software de livre distribuição, o SAM (spatial analysis in macroecology).
MITOCÔNDRIAS E IMUNIDADEA originalidade do artigo, contudo, não é condição suficiente para um desempenho extraordinário nas citações. Ajuda bastante quando o tema de pesquisa vive uma efervescência e está na agenda das revistas científicas internacionais. Décadas de dedicação a um assunto que vem ganhando importância na bioquímica explicam as quase 400 citações de um artigo publicado na revista FEBS Letters pelo grupo de Anibal Vercesi, professor da Unicamp e um dos coordenadores de área em Biologia da FAPESP. O paperapresenta um modelo para o funcionamento das mitocôndrias em situação de estresse oxidativo. Num pós-doutorado que fez na Universidade Johns Hopkins, entre 1976 e 1977, Vercesi descreveu resultados que mais tarde se tornaram relevantes para explicar o papel das mitocôndrias na morte celular. Demonstrou, com o grupo norte-americano, que os íons de cálcio são sinalizadores para a abertura de um poro na membrana mitocondrial (poro de transição de permeabilidade) que desencadeia o processo de morte celular. Nos últimos anos, avançou nessa vertente esmiuçando como esse mecanismo é acionado em situação de estresse, quando a célula sofre a agressão de radicais livres. O papel das mitocôndrias em doenças vem se tornando alvo de investigação frequente. Vercesi e dois ex-alunos, Alicia J. Kowaltovski, hoje no Instituto de Química da USP, e Roger F. Castilho, da Unicamp, escreveram o paper. “O artigo é resultado de pesquisa feita no Brasil. Mas gosto de lembrar meus alunos que provavelmente a linha de investigação não existiria se eu não tivesse feito o pós-doutorado nos Estados Unidos”, diz.

Pioneirismo e oportunidade explicam o grande número de citações de um artigo brasileiro publicado em 2001 no Journal of Imunology, acredita o chefe do grupo responsável pela pesquisa, o imunologista Ricardo Gazzinelli, da Universidade Federal de Minas Gerais e da Fundação Oswaldo Cruz. “Houve uma mudança de enfoque na pesquisa em imunologia no final dos anos 1990, com as atenções voltadas para os receptores da imunidade inata”, diz, referindo-se aos mecanismos de defesa inicial contra infecções, aqueles que atacam prontamente os invasores, e seus receptores que reconhecem agentes infecciosos. “Nosso trabalho foi o primeiro que se dedicou a estudar o papel desses receptores nas infecções com protozoários e nos tornamos referência nisso. A área cresceu muito na imunologia”, afirma. O grupo de Gazzinelli continua trabalhando nessa vertente, tanto com o protozoário estudado no artigo, o Trypanosoma cruzi, causador do mal de Chagas, quanto com oPlasmodium, o parasita da malária, mas também busca aplicações, em imunoterapias e no desenvolvimento de adjuvantes imunológicos empregados em formulações de vacinas.

COR E ANCESTRALIDADEAlguns trabalhos da lista chamam a atenção pela repercussão que amealharam também entre o público leigo. Um artigo publicado em 2003 na revista PNAS aponta a impropriedade do conceito de raça do ponto de vista biológico ao demonstrar que, no Brasil, a correlação entre cor e ancestralidade genômica era muito frágil. “Em outras palavras, mostrou que, em nível individual, é praticamente impossível inferir a ancestralidade genômica de um brasileiro a partir de sua cor e vice-versa”, diz seu autor, o geneticista Sérgio Danilo Pena, professor da Universidade Federal de Minas Gerais, responsável por uma série de estudos sobre a composição genética da população brasileira. Segundo ele, a pesquisa repercutiu porque abordou um tópico de interesse geral. “Mas as citações têm mais a ver com aspectos científicos e com a novidade de nossos achados”, diz.
Há um grupo de artigos que evidencia a contribuição da pesquisa médica do país para o desenvolvimento de terapias e medicamentos. Dois artigos publicados em 2001 na revistaCirculation, de autoria do cardiologista José Eduardo Sousa, do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, apresentaram os primeiros resultados de um estudo clínico, realizado com 30 pacientes brasileiros, que tiveram grande impacto no tratamento de portadores de aterosclerose, doença inflamatória em que ocorre a formação de placas dentro dos vasos sanguíneos. Os papers registraram o alto grau de eficácia de um procedimento que hoje se tornou corriqueiro: a aplicação de uma droga, a rapamicina, nos stents, as próteses usadas para manter abertas as coronárias lesionadas. “Os artigos, que mostravam pela primeira vez a evolução dos pacientes logo após o procedimento e um ano depois dele, evidenciaram que a rapamicina, quando liberada ao longo dos primeiros 30 dias, conseguia evitar na maioria dos casos a formação de um tecido cicatrizante no local do stent que frequentemente fazia a artéria entupir de novo”, diz Sousa, pioneiro no Brasil na utilização de angioplastia, que é o esmagamento da placa por meio de um balão, e dos stents.

O desenvolvimento e o teste de uma vacina contra quatro dos tipos mais prevalentes do vírus do papilomavírus humano (HPV), hoje disponível comercialmente, também resultaram num artigo altamente citado, cuja autora principal é a médica e pesquisadora Luisa Villa, diretora da filial brasileira do Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer. “Foi a primeira demonstração da vacina com os quatro tipos, atestando sua imunogenicidade e eficácia em humanos, e teve um impacto enorme”, diz ela. Em 90% dos casos a vacina preveniu o aparecimento de verrugas genitais e em 86% evitou o surgimento de infecções (ver Pesquisa FAPESP nº 157). Publicado em maio de 2005 na revista Lancet Oncology, o estudo foi patrocinado pelo laboratório Merck, criador da vacina, e envolveu pesquisadores de países como Estados Unidos e Noruega. Mas os quatro primeiros autores são cientistas brasileiros, de instituições como o Instituto Brasileiro de Controle do Câncer, o Hospital A.C. Camargo e a Unicamp, sob a liderança de Luisa Villa. “A Merck entendeu que a participação dos pesquisadores e dos pacientes brasileiros teve papel preponderante na realização do teste clínico”, afirma. Segundo ela, o trabalho foi importante para agilizar a utilização da vacina no Brasil.
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