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parte 1/3
A verdadeira utopia
Para dar conta das necessidades de transformações na sociedade, é preciso ir além do imaginado por Marx e não temer radicalizar a atualizar suas noções de proletariado e comunismo
Por Slavoj Zizek* Tradução: Maria Beatriz de Medina
General Intellect Incluído em Grundrisse, livro de Karl Marx publicado postumamente - para muitos uma base para entendermos as sofisticadas teorias e esquematizações de O Capital - o termo gene ral intellect significa, em linhas gerais, a inteligência social ou coletiva, o trabalho imaterial. De certa forma, se opõe ao conceito de propriedade intelectual individualizada. |
Talvez aqui resida a "contradição" fundamental do capitalismo "pós-moderno" contemporâneo. Enquanto sua lógica é desreguladora, "antiestatal", nomática/desterritorializante etc., a tendência principal do "tornar-se-renda-dolucro" assinala um fortalecimento do papel do Estado, cuja função (não somente) reguladora é mais e mais onipresente. Desterritorialização dinâmica coexiste com e se apoia mais e mais em intervenções autoritárias do Estado e seus aparelhos legais (e outros). O que é possível discernir no horizonte do nosso porvir histórico é, assim, uma sociedade em que liberalismo pessoal e hedonismo coexistem com (e são sustentados por) uma complexa rede de mecanismos estatais regulatórios. Longe de desaparecer, o Estado está se fortalecendo.
Negri Filósofo e militante político italiano, Antonio Negri (Toni Negri) é coautor, com o filósofo americano Michael Hardt, dos livros Império e Multidão. Negri atuou nos anos 1940 e 1950 em organizações católicas progressistas e, em seguida, militou no Partido Socialista Italiano. Participou dos eventos de 1968 na Europa e, devido às suas ações revolucionárias, foi preso algumas vezes pela polícia italiana - "acusado de subversão contra o Estado". Negri editou periódicos marxistas e recentemente participou de edições do Fórum Social Mundial. |
Por que, então, milhões de pessoas ainda compram produtos da Microsoft ? Porque a Microsoft se impõe como um padrão quase universal, (quase) monopolizando o mercado, uma espécie de encarnação do general intellect. Gates se tornou o homem mais rico do mundo em algumas décadas apropriando-se da renda cobrada pela permissão, dada a milhões de trabalhadores intelectuais, de participar da forma de general intellect que ele privatizou e controla. É verdade, então, que os trabalhadores intelectuais de hoje não estão mais separados das condições objetivas de seu trabalho (eles possuem seu próprio PC etc.), o que seria, em Marx, a descrição da "alienação" capitalista? Sim, mas, mais fundamentalmente, não. Eles foram mutilados do campo social de seu próprio trabalho, do general intellect - que por sua vez é mediado pelo capital privado.
E o mesmo acontece com os recursos naturais. Sua exploração é uma das maiores fontes de renda hoje em dia, acompanhada pela luta por quem irá controlar essa renda, as populações do Terceiro Mundo ou as corporações ocidentais. A ironia suprema é que, para explicar a diferença entre força de trabalho - que, em seu uso, produz mais-valia sobre seu próprio valor - e outras mercadorias - cujo valor é simplesmente consumido em seu uso, sem envolver exploração -, Marx menciona como exemplo de mercadoria "comum" o petróleo, a mesma mercadoria que hoje é a fonte de extraordinários "lucros". Aqui também não faria sentido vincular os aumentos e as quedas do preço do petróleo à exploração do trabalho - o custo de produção é negligenciável, o preço que pagamos pelo petróleo é a renda que pagamos aos proprietários desses recursos por sua escassez e oferta limitada.
ZIZEK NO BRASIL A recepção às ideias de Slavoj Zizek no Brasil iniciou-se pela via academica no final dos anos 1990. Após o atentado de 11 de setembro de 2001, os intelectuais de esquerda renovadores e criativos voltaram a ser notados para além dos centros de estudo. Seus artigos, livros e entrevistas chamaram a atenção dos leitores brasileiros. Em 2008, Zizek participou do programa Roda Vida, da TV Cultura, retransmitido para outras emissoras públicas do país. Sua fala rápida, seus gestos repletos de tiques e movimentos tensos compõem a personalidade carismática e curiosa do pensador esloveno. Em maio de 2011, Slavoj Zizek esteve em turnê pelo Brasil para lançar seus livros Em Defesa das Causas Perdidas e Primeiro como Tragédia, Depois como Farsa. Participou do seminário Revoluções - uma política do sensível (São Paulo, dia 21/5) e de uma conferência no Rio de Janeiro (24/5), este último a convite de um grupo de instituições universitárias e de pesquisa formado pelo IEAH, PUC-Rio, Clacso e Flacso. Participou ainda, na capital paulista, do ciclo de palestras III Congresso de Jornalismo Cultural - Cult/ Sesc-SP. (Da Redação) |
O que é possível discernir no horizonte do nosso porvir histórico é, assim, uma sociedade em que liberalismo pessoal e hedonismo coexistem com (e são sustentados por) uma complexa rede de mecanismos estatais regulatórios. Longe de desaparecer, o Estado está se fortalecendo
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