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Comparação entre Amazônia e Suécia mostra que corpos d’água tropicais podem ser mais sensíveis à temperatura
MARIA GUIMARÃES | Edição Online 20:46 12 de maio de 2014
Em tempos de mudanças globais no clima, pesquisadores do mundo todo têm se concentrado em mapear, com a maior exatidão possível, as fontes de gases responsáveis pelo efeito estufa e os processos capazes de aprisionar esses gases. Pensando nisso, o ecólogo Humberto Marotta, professor no Departamento de Geografia da Universidade Federal Fluminense (UFF), em Niterói, comparou o que acontece com a matéria orgânica armazenada em lagos sujeitos a temperaturas muito diferentes. Os resultados, publicados em 11/5 no site da Nature Climate Change, contrariam as expectativas e indicam que as águas próximas ao equador podem aumentar mais as suas emissões em caso de aquecimento, em relação àquelas mais perto dos polos.
Enquanto Marotta coletava amostras de sedimento do fundo de lagos suecos, durante um pós-doutorado na Universidade de Uppsala, sua colega Luana Pinho, na época doutoranda da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), recolhia material semelhante na Amazônia. Com o sedimento armazenado em frascos, ela imediatamente embarcou para a Suécia, onde os dois pesquisadores começaram o experimento em conjunto com Alex Enrich Prast, professor de Ecologia da UFRJ e também coautor do estudo, e outros pesquisadores suecos. Eles distribuíram o material dos nove lagos tropicais e oito boreais em frascos submetidos a temperaturas diferentes, desde 4,3 graus Celsius (°C) até 40,5°C, por um período de incubação que variou entre 0 e 44 dias. Depois disso, eles estimaram a quantidade de gás carbônico (CO2) e metano (CH4) emitida por cada uma das amostras.
Embora a produção de matéria orgânica seja maior na região amazônica, esse material se decompõe rapidamente devido às condições de temperatura e umidade. “A comida estraga fora da geladeira porque é quente”, compara o pesquisador da UFF. Em contraste, nas regiões frias essa matéria orgânica permanece preservada no fundo das águas geladas. “Por isso, antes do artigo acreditávamos que com o aquecimento os lagos boreais liberariam mais gases”, conta Marotta. Mas não foi isso que os experimentos e as análises estatísticas mostraram. “Se constatou que o efeito da temperatura pode ser parecido nos lagos tropicais e boreais.”
Assim, considerando o cenário B1 do IPCC, que imagina uma situação em que as emissões de gases de efeito estufa aumentem até o meio do século e depois se reduzam graças a medidas de mitigação, Marotta e colegas calcularam que as emissões de lagos tropicais podem ser até três vezes maiores do que as de boreais. Mas, segundo ele, o efeito poderia ser ainda potencializado pela importância de outros ecossistemas aquáticos acumuladores de matéria orgânica além dos lagos nas regiões tropicais. “Somente na Amazônia, por exemplo, existem extensas áreas alagadas rasas como pântanos ou alagadiços que não consideramos no estudo”, diz. Se isso acontecer, pode agravar ainda mais o quadro que leva ao aquecimento do planeta.
Para a pergunta que imediatamente surge – por que os lagos tropicais teriam uma resposta até mesmo mais acentuada ao aumento de temperatura? – ainda não há resposta. “Estamos agora na fronteira do conhecimento”, diz Marotta. Entender melhor esses processos é o próximo objetivo dos pesquisadores envolvidos no estudo.
Artigo científicoMAROTTA, H. et al. Greenhouse gas production in low-latitude lake sediments responds strongly to warming. Nature Climate Change, on-line 11 mai 2014.
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